quarta-feira, dezembro 10, 2008

Conversas sobre... avaliação

A minha turmita nova não estava habituada a um processo de auto e hetero-avaliação mais "formal"... em que em vez de pedir aos alunos (oralmente ou mesmo por escrito) que discorram sobre a nota que merecem (e "pedem") e as razões "gerais" que sustentam a proposta ("pedido"), os faço trabalhar sobre as evidências do seu trabalho ao longo do período e aplicar os mesmos critérios que eu tenho de aplicar (de Departamento e de Escola).

Algumas desvantagens da primeira forma de o fazer (embora seja mais rápido e simples e uma solução possível para quem tem mais de 5 turmas)?
Desconhecimento e não compreensão dos critérios aplicados na escola... Criação de espectativas irreais: "Ah, eu porto-me bem, faço os TPC, participo, portanto acho que mereço um três..." esquecendo-se o aluno, por exemplo, de que todas as avaliações formais escritas ou orais revelaram sempre insuficiência nas aquisições mais básicas e na capacidade de utilizar conhecimentos em diferentes situações...E lá explica o professor que tal e tal, que não chega, que ele é lindo e isso, mas que também é preciso que... E lá aplica o professor o que entende, depois do aluno "pedir" o que "quer"...

Para evitar estes momentos, criei um documento único de referência (melhor dizendo, dois... um para Matemática e outro para Ciências) que é meu e deles. Uma espécie de folha de caderneta comum muito especial que contém em si todos os critérios e permite a sua aplicação de forma tão clara quanto possível para alunos desta faixa etária.

Nele deixo logo registadas a lápis as avaliações mais directamente relacionadas com as competências específicas das disciplinas (testes, problemas, uma ou outra situação de avaliação oral, trabalhos obrigatórios e facultativos, individuais ou de grupo - avaliações de que tiveram. No verso têm o guião usado na escola para os outros aspectos, espaço para a auto-avaliação (e observações - declaração de intenções para o período seguinte) e a tabela que sintetiza os critérios de avaliação da escola. ( tem uma pequena alteração agora... embora eu discorde, a escola decidiu em Pedagógico que o limiar para atribuir o Bom passava a ser o estabelecido nos exames... 70% e não 74%... o que nos levou ao mui célebre paradigma do 69... que passou a ser considerado quase Bom, Suf.+......!... Em alguns países... abaixo de 60 considera-se que a prestação não é satisfatória... Para mim... tudo o que aparecia antes do 80 era um Bom magro... gosto de puxar por eles... e agora partilho com eles o meu desgosto por ter de lhes atribuir Bom por "tão pouco"... Aplico, mas sob protesto. Eles riem e entendem. Já me conhecem. Não é a questão apenas da percentagem... não são as questões numéricas que alteram o trabalho ou o que desejamos saber e ajuizar... é a questão de princípio... baixar sempre a bitola de exigência... sempre e sempre...)

Desta forma as crianças reflectem sobre o seu trabalho, ponto a ponto e não se iludem. Tal como é dito na lei, eles devem saber exactamente quais os critérios que levam o professor a fazer os seus juízos sumativos... Usá-los é a melhor forma de os conhecer e de os compreender.
Para quem é meu aluno desde o 5º ano, o processo está interiorizado e alguns alunos até criam registos próprios dos TPC não feitos, das notas dos testes, das faltas dadas, auto-avaliação do caderno, da sua participação nas aulas, cumprimento de normas, etc.,... para manter a memória fresca e depois serem mais justos e rápidos na sua auto-apreciação, evitando as conversas do tipo: mas eu não fiz dois trabalhos de casa? Eu acho que fiz todos...! E o professor a apontar para a grelha onde registou tudo tentando convencer o aluno de que não cumpriu...
É uma oportunidade excelente para fazer os alunos conhecer e compreender palavras/conceitos como assiduidade, pontualidade, e muitos outros (há sempre quem pergunte o que é isso).

Hoje, na turma menos experiente (que gostou do processo e aderiu bem), um aluno levantou os olhos da ficha e pediu: oh professora diga lá outra vez o que significa isso dos hábitos de trabalho autónomo... E eu, com paciência, lá voltei ao assunto... trabalhar sem ser preciso estar um adulto ou alguém constantemente a controlar o trabalho ou o estudo, a mandar fazer os TPCs, a pedir que preste atenção, que se concentre nas tarefas, tomar decisões adequadas às necessidades, assumindo a responsabilidade de trabalhar quando é preciso...
Nem me deixou acabar:... agarrou no lápis e sorrindo disse-me: já percebi... neste é: Suf. menos.

Os níveis propostos coincidiram todos.
No processo de hetero-avaliação, comunico as coincidências, assinalo as diferenças (que no caso das "atitudes e valores" umas vezes, poucas, descem ou sobem consoante a minha argumentação e a deles). Ficamos todos mais enriquecidos pelo processo que levo muito a sério (percebem isso). E eles tomam consciência mais clara do que falhou e de que forma o que falha pode interferir na avaliação final de cada período.
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Dá trabalho?

Muito. Gastei grande parte do fim-de-semana nas avaliações, e gasto regularmente tempo a manter os registos organizados e actualizados (ainda por cima instituo muitos momentos de avaliação entranhada no trabalho...). E não sou das mais penalizadas, pois entre Matemática e Ciências avalio 100 alunos, aos quais se acrescentam, em parceria, mais quase 80 (EA e AP). Há colegas com pesos muito maiores...

É por estas e por outras que continuarei sempre a defender que o tempo gasto na escola deve ser essencialmente colocado ao serviço dos alunos (sobretudo os nossos, o que não acontece desde há três anos), das práticas , da partilha e da nossa aprendizagem e crescimento profissionais. Assim se constroem melhores profissionais e mais sucesso...

O resto são cantigas... e, infelizmente, desafinadas.

(A tese? Que tese? O ECD diz que devem ser feitas e para além de dever é direito... não explica é como, nem com que tempo o professor estuda e cresce...)

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