sexta-feira, abril 07, 2006

Páscoa

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Há cerca de três semanas dei com uma Panterinha no meu jardim. Nada de extraordinário, que o meu jardim é visita regular dos felinos da zona (como qualquer jardim). Foi assim que juntei à casa casa e à casa do coração o Clóvis e o Jasmim de que vos falarei um destes dias. Foi assim que cuidei de pardais, pintassilgos, verdilhões, borboletas (um dia explico)... Mas esta Panterinha não vinha só. Dentro dela avizinhava-se o milagre da vida e do abandono que se lhe iria seguir. Porque o meu país frequentemente não cuida de zelar nem pelas suas crianças, nem pelos seus velhos, nem pelos seus animais (já sem falar de outras "espécies" essenciais à vida...).
Foi ficando (talvez pressentindo que havia feito a escolha certa). Tempo de criar laços, alimentar-lhe e acariciar-lhe o corpo e de pensar na decisão a tomar. Não foi fácil. Também não foi difícil.
Há dois dias percebi os sinais. Recolhi-a. Acolhi-a. Escolhemos juntas o local, não deveria ter sido tarefa fácil, porque na natureza não é assim que funciona e esta gatinha não sabe o que é uma casa. Mas estranhamente foi. Ela deixou-se conduzir com confiança. Deixou-me ajudar. Nasceram ontem à tarde. O sexto custou, mas conseguimos. Tudo ao contrário do que li, do que vi. Mexi, limpei, toquei, parecia que sempre estivera aqui, que me conhecia de longa data. Estão todos bem. Agora a tarefa de procurar donos responsáveis e de prevenir futuras gravidezes. É um gesto de cidadania. Quando está ao nosso alcance agir, devemos fazê-lo. Felizmente foi possível.
Arranjei mais trabalho, eu sei. Mas a alma está leve e a consciência limpa. A Páscoa é este (re)nascer. E às vezes sinto que ao cuidar do jardim, dos animais, dos alunos, de um poema, de um livro... ao decidir não fechar os olhos, tudo se resume a isto: Amor.
É mais forte do que eu. Como um destino que não controlo. Deixo-me ir. Talvez por isso os alunos percorram confiantes os caminhos, o jardim me recompense com tanta beleza e a Panterinha durma descansada ali no quarto ao lado.
No final das contas sou eu sempre quem fica a ganhar com o que recebo em troca. Esta paz que sinto (e de que estava tão precisada) prova-o de uma forma "muito científica"...

A energia que recolher irá depois inteirinha para os alunos.

Preciso deste tempo de Páscoa...

ADENDA: Depois da reunião de CP extraordinária, fui para o veterinário com a Pantera e os filhotes. Queria certificar-me de que estava tudo bem (o meu Anjo da Guarda - leia-se: o meu irmão veterinário Paulo Miguel que mora na Guarda - fez a assistência por telefone, várias vezes durante a tarde e noite e manhã - já perceberam o Anjo da Guarda? - e aconselhou-me a tomar estas precauções.)
Ou bem que se faz tudo como tem de ser, ou bem que não se faz.
Raios X, injecçãozita de ocitocina para ajudar a expulsar os restos, prevenção de parasitas externos e internos... enfim. Tudo certinho, muito leitinho, uma família saudável e feliz...

Por que razão não sou Veterinária? Porque me faz alguma impressão aquela parte das cirurgias, as mortes, os cenários mais duros que eles têm de viver... porque queria ser tanta coisa nesta vida, mas o tempo não chegava para tudo e houve que escolher. Escolhi fazer o máximo que podia de tudo o que amo.
As dúvidas começaram cedo e nunca partiram. Mas essa é quem eu sou. Quando descobri que não havia mais nada a fazer, deixei-me levar pelo vento e pela corrente e vim ter ao sítio certo. Aqui. Exactamente onde estou.


Que hei-de ser quando crescer?
Nov 1973 - 11 anos

Hei-de ser pastora?
Poeta?
Pintora?
(Que p'ras artes cá estou eu)

Ou serei professora
que ensina tudo o mais?
Ou Veterinária
que trata de animais?

Gostava de ser veterinária...
Mas pensar nisso para quê?
Mais vale esperar até crescer.
E depois?

Depois... logo se vê.

10 comentários:

Teresa Martinho Marques disse...

Pois foi... Logo a minha Maria! Vou fazer uma entradinha em homenagem a esse encontro tão especial...
Beijinhos

Teresa Lobato disse...

Sensibilizei-me demais com este teu post...Eu também já passei por experiências dessas, quatro vezes! E é sempre como se fosse a primeira vez. A minha Milu, a mais nova, nasceu cá em casa, faz em Julho um ano. É a danadinha que quer mandar em todos, até no pai. Gosto de estudar o comportamento deles, sentar-me a apreciá-los, tentar entender as suas atutudes, que muito nos ensinam sobre a vida.
Não te preocupes com o seu destino: encontrarás entre os teus alunos, de certeza, quem os abrigue.
E depois aquele poeminha...
Rom-rons para ti e para os teus gatos.

E disse...

Oh tão lindos, mãe e filhos.Tiveram muita sorte, foram logo ter ao melhor sítio.
À tempos uma gatinha aqui da minha rua também teve gatinhos, felizmente também houve boa gente que a ajudou. Para mim é muito triste a situação destes animais. Também anda aqui um gatinho abandonado à pouco tempo, muito meiguinho, sempre que vê alguém vai logo esfregar-se nas pernas da pessoa a ronronar, a pedir miminhos. Ontem foi o que me aconteceu ao chegar a casa, não resisti àquela meiguice e dei-lhe uns miminhos, ao fim, depois de ter entrado e fechado a porta do prédio, o pobrezinho vai sentar-se à porta a miar com uns olhos tão tristes. Com tudo isto eu que já estava a ter um dia menos bom, fiquei de rastos, com uma vontade reprimida de pegar naquele gatinho e trazê-lo para o quentinho de casa (chovia tanto lá fora...).

Teresa Martinho Marques disse...

Rom rom para ti e para os teus felininhos (Adorei as fotos que enviaste!). E eu que dizia não gostar de gatos! Rendi-me completamente...
Beijinhos e obrigada pelas tuas palavras.

Teresa Martinho Marques disse...

Elisabete, é bom saber que os mais novos têm o coração do lado certo. Percebo também que eu posso tomar decisões mais facilmente porque a casa é só nossa. Obviamente na tua situação há que considerar a disponibilidade dos pais... e nem sempre a vida o permite. Entendo isso. Mas, se possível, tenta encontrar-lhe dono, ou contactar uma daquelas entidades de protecção de animais aí de Setúbal. Eu sei que há gente a trabalhar nesse sentido, mas não tenho contactos. Depois diz se conseguiste.

imaz disse...

Que ternura!E que escolha acertada fez a Panterinha...
Boa sorte

a d´almeida nunes disse...

Tenho dois gatos
A Lili e o Rapazito
Ai os atacadores dos sapatos
Mas que lindo parzito

Tenho dois cães
A Lala e o Tico
Ela com ohar descaído e doce
Ele ladra, ladra, aquele mafarrico!

Também tenho pássaros
E lagartixas
E abelhas e abelhões
Recolho chuva em cântaros

A Natureza é Deus
Todos os seres da Terra
São Deus!...

Teresa Martinho Marques disse...

Obrigada pelos vossos mimos! Uma Boa Páscoa!

Anónimo disse...

(Sem palavras digo:

LINDO!...)

Mónica

Teresa Martinho Marques disse...

Obrigada Mónica! Quando retomarmos as aulas, vão ter de me ajudar a encontrar donos responsáveis... Beijinhos