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Acordei com um vago sentimento de saudade...
De ser professora...
De um tempo com tempo para demorar os minutos...
De um tempo de absoluto prazer oferecendo o melhor aos alunos (gastando todo o tempo do mundo), sem a cabeça cheia de apreensões e revoltas por dentro...
Um tempo cheio de crianças em volta... (cada vez agora mais substituídas por papéis)
A minha irmã Lena (Educadora de Infância) deve ter pressentido...
Sabendo-me também a recuperar de pé (sempre de pé, sem tempo para faltar) de uma crise que mereceu a atenção de antibiótico, resolveu fazer-me uma surpresa...
Acabei de atender o telefone (ela trabalha lá para as bandas do Oeste) e de ouvir os 25 meninos de que cuida a cantar para mim duas canções que compus há tempo (no tempo em que tinha tempo para oferecer mais magias, do que só as esperadas, aos meus meninos). Os "Números" e o "Sol".
Comovi-me, claro. Mas o que é que querem? É a saudade do futuro que receio não voltar a ver.
Preciso de criar para me manter do lado iluminado da vida e assim reflectir e derramar o sol para cima de quem esteja disposto a não se resguardar na sombra da tristeza. A luta para o conseguir por entre a aridez da burocracia escolar e a sensação de que não querem que eu exista, começa a mexer comigo e a tolher-me os movimentos. Eu tento boiar. Eu quero boiar.
Parece que me empurram para baixo de água.
Passarei a escrever, a criar, quando conseguir, na clandestinidade das sobras cansadas dos dias.
O que me traz de novo à saudade.
Apagada pelas vozes de 25 meninos pequeninos do outro lado da linha cantando, pedindo.
Anda cá! Anda cá através do telefone!
Eu vou, eu hei-de ir para o ano, Lena, prometo, meninos, prometo. Mesmo que não me deixem eu vou ter com vocês e hei-de cantar-vos tudo o que souber, sentada no chão do vosso lado. Este ano já não posso. (Mas consegui visitar outros meninos num tempo de vida que seria meu e foi só deles com prazer. Porque a Escola para mim é sem fronteiras como o céu de José Gomes Ferreira. Não há várias escolas. Há uma apenas, num abraço gigantesco que não nos querem deixar dar.)
Procurarei reinventar um tempo novo, perdido por entre o tempo marcado nos relógios, para mais um poema, mais uma canção, mais um gesto de amor. Na esperança de que, tal como disse alguém segredando docemente no meu ouvido, se cumpra a magia do poeta:
quanto mais te dou mais tenho para te dar
Votos de Boas Festas
Há 6 anos
16 comentários:
Também eu me comovi... com o teu texto, e porque te compreendo muito bem.
Lembrei-me agora de uma canção da Mara Abrantes que a minha Mãe cantava (ela cantava muitas poucas vezes) enquanto adormecia os meus irmãos.
"Encosta a tua cabecinha no meu ombro e chora / E conta todas tuas mágoas todas para mim / Quem chora no meu ombro jura que não vai embora / Que não vai embora..."
Tenho esta canção na memória mais profunda do meu consciente de menina. Eu sei que ela também me cantava assim.
«Preciso de criar para me manter do lado iluminado da vida (...) A luta para o conseguir por entre a aridez da burocracia escolar e a sensação de que não querem que eu exista, começa a mexer comigo e a tolher-me os movimentos.»
Irmanada neste sentir, Teresa. Como compreendo! Assim como compreendo a saudade de um tempo com tempo para dar "outras magias" aos nossos alunos.
Outros tempos hão-de vir. Até lá, reinventaremos um tempo novo, multiplicando o que nos roubam.
Melhoras. E coragem!
Olá Teresa!
Gostámos do seu comentário. Também gostamos muito de ilustrar as frases dos meninos do Alentejo.
Beijinhos!!! Ana e Cláudia.
quanta saudade temos todos deste tempo...
Esperemos que o devolvam.
Obrigada pelo vosso carinho e palavras doces. É só uma fase se tanto trabalho e tanto papel que qualquer almita, mesmo das alegres e entusiastas, sucumbiria momentaneamente ao peso... Estive um bocadnho doente (o que nos retira energia) mas nada de grave, já estou em plena recuperação. Só um cansaço acumulado deste ano estranho... Mas comi agora umas amoras do jardim, li as vossas palavras e milagre! Já me sinto melhor (mesmo com tudo o que há para fazer...). Beijinhos :)
Só para deixar mais um voto de bom trabalho ;)
..."cada vez agora mais substituídas por papéis" ..... "parece que me empurram para debaixo de água"
Teresa, tens a certeza de que vale a pena? Não te digo para deixares esse trabalho que disseste que tinhas que fazer em 3 semanas, pois já te comprometeste com ele, mas, a seguir, repensa e pesa o que vale a pena, a papelada (PE, PC, etc, escritos)não vai fazer nadinha aos alunos e é por eles, com eles e para eles que gostas de trabalhar. Só me atrevo a deixar-te este pensamento porque o facto de ter há muitos anos comeceçado a pesar sempre o que vale a pena (e quero)investir o meu tempo e cansaço é que fez que as minhas opções passassem a dar-me sempre sentido à minha vida. Disse muitos sins na vida, mas também disse muitos nãos.
[Como diria o Miguel, não fazem mal outros olhares :), por isso desculpa o meu]
Um grande beijinho
P.S. Sairam umas gralhas ao escrever, mas acho que se percebe.
Não sei se vale a pena... esse trabalho nem será a questão principal... no contexto (que não descreverei aqui) vivido na escola faz sentido eu dar o meu apoio... a questão é que sempre tive tempo para tudo, mas com todos estes acréscimos horários terei de re-equacionar os meus contributos para o próximo ano. Depois quando és eleito para algo que não queres e és um bocado perfeccionista como eu, no final do ano a fartura é tanta que tudo acumulado parece muito (falo do cargo de coordenadora de DT que só me sai do pêlo e não do coração). PAra o ano a perspectiva é melhor: estar ligada ao CRE/Biblioteca com tempo e espaço para fazer coisas de que realmente gosto e para as quais me sinto verdadeiramnete motivada. Aliás hoje acordei bem disposta relativizando as coisas... as férias estão quase aí... há dias em que o peso parece excessivo, depois descansas um bocado e percebes que nem tudo é assim tão mau. MAs tens razão em tudo o que dizes... só que este ano foi mesmo um bocado incontornável... estar no CP (que este ano tem sido para lá de aborrecido)não foi opção minha e posso dizer-te que dei logo no início do ano o maior NÃO da minha vida (que aliás até me pode vir a ser prejudicial e tive de fundamentar muito bem): fui eleita presidente do CP e recusei o cargo... Olha como eu estaria agora se tivesse dito sim!!!!! Nem é bom pensar! Enfim... Obrigada pelas tuas palavras...
que texto tão comovente, sobretudo porque tão bem o entendo :/
obrigada!
Obrigada eu Pandora... a blogosfera tem destas comunhões... É bom. Sabe bem.
Não sabes, mas costumo passar por cá. Breve, breve, com o pouco tempo que tenho. Reparei num gato preto e branco e lembrei-me do meu PB Fellini. Continua no lado iluminado da vida, pois só assim poderás ser melhor professora e melhor pessoa. Um beijo grande.
Por isso eu digo e repito sempre:
É BOM SER PROFESSOR e
BOM PROFESSOR NÂO ENVELHECE NUNCA...E NÂO MORRE ENQUANTO DELE PERDURAR UMA MEMÓRIA DOCE NAQUELES QUE AJUDOU A CRESCER.
E isso nenhuma Ministra ou 1º ministro (que são sempre seres de passagem)nos poderá fazer esquecer.Mesmo na noite triste que vamos atravessando.Se nós não resistirmos e não mantiveros esta fé (ainda que por vezes a amargura a substitua) quem vai fazê-lo?Dessas coisa também eu,professora aposentada, tenho saudades.
Tens razão Amélia...
Obrigada pelas tuas palavras...
Cláudia! Que bom saber que por vezes ficas presa na teia! Ontem não consegui responder, porque isto estava com problemas... mas não quis deixar de te dizer que é bom saber de ti... Muito bom...
E o Felini... o felini... saudades de um tempo em que tínhamos tantos sonhos...
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