Manhã em Setúbal para a reunião habitual do SABE (Bibliotecas Escolares). Corrida breve até casa (mais para tratar dos seres à minha guarda, do que de mim) e de novo saída para a tarde de aulas.
Vou sempre mais cedo.
A componente individual começa logo a cumprir-se nos tempos de tratar das coisas que é preciso tratar fora dos tempos propriamente ditos das actividades lectivas. Confuso? Nem por isso. As coisas não aparecem nas nossas mãos por magia. Provavelmente acredita-se que todo o professor chega exactamente à hora, sai exactamente à hora, contabiliza cada minuto dado e recusa qualquer minuto extra. Que a componente individual é aquela coisa gasta lá por casa em que sobra sempre imenso tempo e falta sempre imenso trabalho.
Quando toca para a saída, invariavelmente, não saio. Não tenho o hábito (nem o têm os meus colegas) de empurrar os alunos para fora da porta de modo a poder aproveitar cada segundo do magro intervalo. Mesmo tentando organizar tudo, há sempre aqueles que se deixam atrasar com intenção... mais uma conversa, um pedido, um mimo, uma atenção especial, uma dúvida... venho pelo caminho (sim, que a sala de professores e o armário do livro de ponto não estão à porta da sala de onde saí) gastando o intervalo na companhia deles e tentando resolver mais uma ou outra coisa em falta.
Vou sempre mais cedo, dizia eu.
Estaciono o carro longe, porque perto é impossível.
Hoje ao fechá-lo, alguns alunos meus abeiraram-se da rede e cumprimentaram. Primeiro só cumprimentaram.
E, depois, eles e outros arriscaram: oh professora, podia apanhar a bola que caíu aí para fora? Humm... A bola? E onde está ela que não a vejo? É ali ao fundo! E lá fui andando... andando... andando... eles do lado de dentro caminhando ao meu lado. Fui até ao fundo e, virando a esquina, lá vi a bola no meio da estrada. Apanhei-a, devolvi-a. Agradeceram. Continuaram o jogo. Cada vez menos tempo a sobrar.
Lá dentro, mesmo antes de conseguir abeirar-me do edifício, mais alguns alunos e mais algumas coisas fora de horas. Sempre sim. Que sim...
Consigo chegar à sala de professores. O mais cedo já se foi. Terei de ir à reprografia depois. Fora de horas, claro.
Professor não tem horário de repartição.
Está sempre de porta aberta.
De coração aberto.
Tratar-nos como simples funcionários, fazer a nossa entrega valer coisa alguma ou simples números em troca de sete anos, pode ter várias consequências. Uma delas é acreditarmos que o somos e passarmos a "funcionar" como tal. Passarmos a só trabalhar exclusivamente nos tempos em que somos realmente obrigados por lei a fazê-lo.
Não meninos, não apanho bola nenhuma... Ainda não tocou para a entrada e só depois do toque é que entro em funções. Aliás, estou na minha hora de almoço (nem almocei)... Não meninos, não, agora não, estou no meu intervalo e só falo com alunos e trato de assuntos educativos na hora de expediente... Não sr EE, venha à hora que eu marquei, não marco outra... O quê? Ver mais testes? Já gastei as horas desta semana... agora só para a semana que vem... e resta saber!
Experimentem olhar para aqueles olhos ansiosos: oh professora já viu os testes? e ter durante vários dias várias reuniões e um não como resposta... (oh noites, oh fins-de-semana)... E, claro, sem falar que é importante perceber rapidamente quais são os resultados para reorientar o trabalho e ajudar quem mais precisa...
Sorte a deste país que tem na classe docente um grupo de gente de coração mole que põe as pessoas em primeiro lugar. As outras pessoas (não a sua pessoa).
Sorte.
Por quanto tempo?
(Espero que o tempo suficiente até alguém acordar e dar pelo óbvio...)
Votos de Boas Festas
Há 5 anos
8 comentários:
O Tempo perguntou ao Tempo quanto Tempo o Tempo tem!?... O Tempo respondeu ao Tempo que o Tempo tem tanto Tempo quanto tempo o Tempo tem!...
Palavras ditas DOUTROMODO:
"Professora!?... Podia apanhar o mundo?"
subROSA
TT,
Hoje vim, de rapidinho, para te ver...e vi mesmo: tenho saudades de ouvir as tuas palavras mansas, da tua "infantilidade" e do teu "prafrentex"...No outro dia estive a ver/rever umas fotos...partiste por uma boa causa: continua a apanhar as bolas...(alguém há-de "acordar e dar pelo óbvio...")
BJKAS (abraçadas)
Ana C.
Só uma palavra me ocorre: EXCELENTE!
Um abraço,
Emília.
Posso... posso apanhar o mundo... não é o que fizemos sempre desde os tempos mais remotos? Saudades Aninha... um destes dias estarei por aí matando saudades... Maio que é o mês do coração servirá para o adoçar na vossa presença... E, Emília, pena que o tempo nos seja roubado e fique tão pouco tempo para o tanto que é preciso e urgente e eu ainda queria fazer... Beijinhos a todos...
:)é pouco mas é BOM e deixa marcas para sempre pelo que vejo...bjs**
Beijinhos Ilda! Obrigada pelas sempre doces palavras...
Também espero... que seja o tempo suficiente para a boa vontade de tantos não começar a escassear.
Um abraço, Teresa.
Pois, Matilde... a esperança é a última sempre a morrer... e nós temos doses infinitas dela... ou não seríamos professores... Beijinhos
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