sexta-feira, outubro 06, 2006

AR LIVRE

Mote do Miguel

Ar livre, que não respiro!
Ou são pela asfixia?
Miséria de cobardia
Que não arromba a janela
Da sala onde a fantasia
Estiola e fica amarela!


Ar livre, digo-vos eu!
Ou estamos nalgum museu
De manequins de cartão?
Abaixo! E ninguém se importe!
Antes o caos que a morte...
De par em par, pois então?!


Ar livre! Correntes de ar
Por toda a casa empestada!
(Vendavais na terra inteira,
A própria dor arejada,
- E nós nesta borralheira
De estufa calafetada!)
Ar livre! Que ninguém canta
Com a corda na garganta,
Tolhido de inspiração!

Ar livre, como se tem
Fora do ventre da mãe,
Desligado do cordão!
Ar livre, sem restrições!
Ou há pulmões,
Ou não há!
Fechem as outras riquezas,
Mas tenham fartas as mesas
Do ar que a vida nos dá!


Miguel Torga
In "Antologia Poética"


Sem comentários: