sábado, fevereiro 01, 2020

Das coisas reais inúteis e da utilidade da fantasia...

Há horas a avaliar planos de trabalho (os PT2, que o PT1 foi o mesmo calvário e já estamos a entrar no PT3... avaliando aluno a aluno, aprendizagem a aprendizagem sem fim à vista). Nada que acrescente nada ao que já fiz com eles, ao que já lhes disse, oralmente e por escrito em múltiplos feedbacks, ao que procurámos trabalhar para recuperar as dificuldades... Nada que acrescente nada ao que fazemos diariamente, mesmo em condições adversas com demasiados alunos por turma (tantos a precisar de tanta atenção) e muito reduzidos e dispersos tempos juntos, em busca de uma diferenciação séria e aprofundada, que obviamente nunca será o que deveria ser por mais decretos a dizer que sim. Ainda nem uma turma acabei e faltam-me mais três (nem tento imaginar como será para professores com mais turmas). Um tempo desperdiçado em que devia/podia estar a estudar para eles, a preparar materiais para eles, a pensar em melhores formas de estar e fazer com eles... Como se os papéis existissem apenas para provar alguma coisa (coisa que nunca precisei de provar e que sempre fiz... melhor e com mais condições do que agora). Não falo sequer já da insustentabilidade do processo, num tempo em que poupar e reduzir custos/papel seria obrigatório (fala-se tanto de sustentabilidade, mas depois...), mas falo da desesperança de ver a escola cada vez mais reduzida a burocracias sem sentido. Do tempo gasto nas aulas a distribuir e recolher papéis, a pedir-lhes que preencham os mesmos papéis que depois passam para mim (e a seguir são arquivados). Desenvolver competências neles devia ser outra coisa... e preferia gastar o meu tempo conversando com eles, já que poucos têm adultos que o façam.  É normal cometer erros quando decidimos fazer experiências por não se prever o que isso representará na prática, mas é loucura insistir e persistir neles quando se percebe que assim não vamos lá. Sempre flexibilizei, sempre diferenciei, junto de cada um deles, sem precisar de mil papéis para provar que o faço. Pior: é possível ter os papéis todos em ordem e nem sequer fazer o que deve ser feito. No entretanto, esgotamo-nos com o acessório e falta a energia e o tempo para o essencial.


 Sou fruto de um sistema que me ensinou a ser crítica fundamentando as minhas observações e parece que o perfil dos alunos deseja essa competência desenvolvida nos alunos, nos cidadãos... será? Confesso um cansaço extremo causado pela inutilidade de muitos (demasiados) gestos na educação e na escola, Como se sempre tivesse sido má professora e só agora é que estamos a fazer coisas bem feitas. Triste.

Ali ao lado, na cabeceira, um livro para reler que aguarda, aguarda, com a natural paciência dos livros. Era com ele que eu devia estar agora.




"«Há sempre a criança que pergunta: como se faz para inventar histórias?, e merece uma resposta honesta. Aqui fala-se de alguns modos de inventar histórias para crianças e de ajudar as crianças a inventarem sozinhas as suas histórias. Espero que este livro possa ser útil a quem acredita na necessidade de a imaginação ter o seu lugar na educação; a quem tem confiança na criatividade infantil, a quem sabe o valor de libertação que pode ter a palavra. 'Todos os usos da palavra a todos' parece-me um bom lema de belo som democrático. Não para que todos sejam artistas, mas para que ninguém seja escravo.»"Gianni Rodari




quarta-feira, dezembro 11, 2019

Pegada de plástico – não há projetos sem conhecimentos


Texto que escrevi para o boletim mensal da escola - "7 partilhas"
 
É um erro acreditar que um projeto pode ser construído sem uma base sólida de conhecimento (aprendizagens essenciais). Se o aluno ainda soletra quando lê, como pode compreender o texto de uma pesquisa ou interpretá-la e compreendê-la? Se não desenvolveu o sentido do número e se engana na utilização de algoritmos, aceitando que numa subtração o resultado pode ser superior ao aditivo; se não sabe dividir ou multiplicar, se não domina conhecimentos básicos de organização e tratamento de dados (OTD), como pode calcular uma frequência relativa (sob a forma de numeral decimal ou percentagem), uma média, ou interpretar os resultados num gráfico? Só em algumas situações (na faixa etária do 5.º e 6.º anos, onde muitos conhecimentos básicos e estruturais não estão ainda desenvolvidos e consolidados) será possível fazer aquisições durante a realização dos projetos e, ainda assim, consumindo muito mais tempo do que o disponível para toda a lista de aprendizagens essenciais previstas.
Vem isto a propósito de um pequeno projeto em desenvolvimento nas turmas C e D do 5.º ano. Vai ser necessário contabilizar o número de embalagens de plástico utilizadas, semanalmente, nos lanches feitos na escola, elaborar gráficos individuais à mão; fazer pequenos relatórios semanais sobre o tipo de alimentos embalados consumidos, refletir sobre a qualidade e adequação dos lanches e pensar em substituições possíveis, simultaneamente mais sustentáveis para o ambiente e mais saudáveis para a saúde. Posteriormente, os alunos poderão compreender como as ferramentas tecnológicas (folha de cálculo, processamento de texto, ...) podem agilizar a construção de um gráfico, a realização de cálculos, ou a elaboração, revisão, correção e enriquecimento de um texto. Podem ser convocadas, para um trabalho como este, as disciplinas de matemática (OTD), de cidadania e ciências (desenvolvimento sustentável, ambiente, saúde), TIC (folha de cálculo, processamento de texto), EV (conceção dos documentos de registo e apresentação) e português (escrita de relatórios reflexivos). Não se admirem, portanto, se entrarem numa aula de matemática (oficina) e os alunos estiverem a fazer exercícios práticos, ou a resolver problemas diversos da unidade OTD, em vez de andarem às voltas apenas com as tarefas mais diretamente relacionadas com o projeto. O tempo é pouco, desaparece em cada aula muito rapidamente e é preciso rentabilizá-lo.
As crianças necessitam de compreender como o conhecimento adquirido pode ser aplicado em contextos reais com interesse para o seu desenvolvimento. Para isso, precisam de compreender também os conceitos e, sobretudo, que qualquer trabalho exige empenho, disciplina, autocontrolo e dedicação. Na vida, um dia, vão perceber que nem tudo é uma brincadeira e diversão, que pode ser um prazer trabalhar muito para obter bons resultados e que nada que valha a pena acontece sem esforço. Quanto melhor a escola souber ajudá-los a compreender esse equilíbrio, mais sucesso terão como cidadãos. Não, não me refiro ao sucesso imediato de uma “boa avaliação” ou “transição”, mas sim à resiliência à frustração, à persistência no trabalho e ao necessário sacrifício útil de tempo, sempre presentes no desenvolvimento de um trabalho de rigor e excelência, seja ele qual for, na escola e na vida.



segunda-feira, novembro 25, 2019

Instantâneos e selfies (nem sempre os melhores) 1: do tempo...



Não sei se terei muito tempo para fazer remakes... mas tentarei.
Um dos sinais de que algo não está bem é o facto de não conseguir, desde há muito, parar para pensar com calma, ou escrever sobre o que penso e sinto. A Teia está às moscas e não é por falta do que dizer, ou vontade de o fazer.
Porque a realidade transcende as (boas?) intenções de quem produz milhares de linhas sobre a educação com infinitas diretrizes, algumas em sentidos opostos, talvez seja boa ideia partilhar retratos do dia a dia. São meus, claro, não os generalizo, mas sei (e não é apenas uma perceção) que não serão muito diferentes de outros que não chegam a ver a luz. O contexto são turmas de 5.º ano (matemática e ciências). Turmas de 26 alunos (alunos com 9 e 10 anos).
Não quero emitir (muitos) juízos de valor, não pretendo tecer muitas reflexões. São as selfies que muitas vezes se apagam porque não mostram o lado mais bonito de nós. Mas são essas que desocultam os não ditos, quebram o nosso isolamento, frustração e sentimento de culpa, e que podem ajudar a perceber por que razão estamos cansados, porque tantas vezes estamos desencantados, feridos ou tristes. Há muita coisa de que me orgulho e que faço bem. Não sou uma professora na média... quem me conhece sabe. Mas só celebrarei as selfies boas, juntamente com as menos boas, para pintar a realidade com as cores que ela tem, sem filtros.

Os alunos entram, raramente todos ao mesmo tempo e a horas. Se for no primeiro tempo as desculpas são variadas, mas com frequência envolvem os pais. Cada vez mais os pais têm todas as culpas quando ouvimos os alunos. É muito raro hoje um aluno dizer que a culpa seja do que for é sua. Os atrasos, o que colocaram no lanche, o facto de faltarem materiais (os pais não colocaram na mala, ficou em casa do pai ou da mãe, quando são casas separadas, ficou no ATL, ficou no explicador, ficou no avô, na avó, no tio, na tia...)
Passam cinco minutos, passam dez... Acalmar as energias e excitações, pedir a muitos que não fiquem sentados a olhar para o vazio sem colocar os materiais nas mesas, abrir a lição. Escutá-los todos os dias, aqui e ali, não tenho o estojo, não trouxe o caderno, não tenho manual, a ficha ficou em casa... Explicar, todos os dias, que não pode ser, que têm de ser mais responsáveis, que se isso acontece resolvem de imediato o problema arranjando uma folha, pedindo um lápis, olhando para o livro do colega... Registo as faltas de presença, são cada vez mais e variadas. Com dificuldade giro as falhas nos processos de aprendizagem quando os alunos faltam amiúde, iterpoladamente, um, outro, depois o mesmo e as unidades de trabalho interrompidas com frequência. Registo nas minhas folhas as faltas de material. Passaram quase quinze minutos, ao mesmo tempo um aluno distribui os planos de trabalho e verifico que continuam (depois de meses) a assinalar mal as tarefas concluídas, ou fora do local, ou assinalando tarefas que nunca fizeram. Quinze minutos já foram e não sei exatamente que aprendizagens essenciais da disciplina desenvolvi. Já estou em stress. Faltam 35 minutos de aula e sinto que não fiz nada. As longas listas de aprendizagens essenciais acumuladas, porque também não acredito em "dar-lhes" coisas a correr sem o necessário tempo de compreensão, prática e a alegria de ser capaz. Às vezes querem falar comigo de tudo e mais alguma coisa, corto-lhes a palavra de coração partido. Gosto tanto de os ouvir. Miúdos, miúdos, temos de começar, não pode ser!
Alguns alunos avançam rápido, outros não. Tento chegar a todos, não há tempo suficiente para os ajudar de facto e diferenciar eficientemente com todos. Corro de grupo em grupo procurando esclarecer, ajudar a vencer dúvidas e dificuldades e há sempre um ou outro que nada faz, se estou a ajudar colegas sem o vigiar, e brinca, faz desenhos, conversa (tenho tido a sorte de, por enquanto, não fazerem mais do que isso... mas não consigo estar de frente para todos ao mesmo tempo e não estou livre de um dia acontecer por uns segundos algo tão mau que apague todo o bom dos muitos minutos que lhes dedico). Chamo a atenção, serve por cinco minutos (se tanto), entretanto o D (autista) está um pouco perdido, mesmo depois de ter sido o primeiro a quem indiquei a tarefa adaptada, não posso estar todo o tempo com ele, mas precisava. Não posso estar todo o tempo ao lado dos que não querem trabalhar e contaminam os amigos mais influenciáveis em volta. Dois tempos por semana tenho a minha Graça a coadjuvar e, ainda assim, não conseguimos chegar a todos em tempo útil. São tantos... tão carentes, tão pouco autónomos (algo que se agrava de ano para ano), tão centrados em si, incapazes de compreender que os outros têm os mesmos direitos, que há 26 na aula, não um. Cada um a precisar de uma coisa diferente e nós a tentar tomar as melhores decisões, decidir a quem vamos, priorizar sem pensar muito, de forma instintiva, porque o tempo não chega para mais.
Universais as medidas, pois, os 54 (116?) que tudo salvam (alguém acredita?) para quem não faz a mínima ideia do que é gerir uma sala de aula, mesmo com toda a boa vontade, experiência e conhecimento que sei possuir. Para alguns foi mais ou menos meia hora de aprendizagens sólidas, para outros muito menos, para alguns pouco ou mesmo nada. Diziam no ano passado os inspetores: o sumário deve ser um momento de evocação, feito em conjunto com a turma... etc. etc.  E deve ser bem explicado lá tudo o que se fez. Aprendi isso há muitos anos, sempre o fiz, mas pela primeira vez este ano escrevo-o no início da aula a correr, a verdade é que se o fizesse da forma correta, nem meia hora de aula sobrava para as ditas aprendizagens essenciais. Para os alunos o sumário tem de ser simples, resumido, genérico, porque cada um fez o que fez e foi até onde foi, e demoram tempos infindos a copiar seja o que for (alguns nem isso, mesmo com insistências sucessivas). O meu, depois, na plataforma, é sempre mais completo e elaborado, para que da próxima vez a inspeção não se queixe de que não fazemos sumários como deve ser.
Olho para o relógio, mais uma vez não cheguei onde queria. É já fora de horas que recolho os planos individuais de trabalho (bolas, lembrei-me agora que ainda nem consegui colocar no primeiro PIT das turmas a avaliação de cada um em matemática). Sinto-me sempre ultrapassada (esmagada) pelo tempo... e eu que até sou rápida a completar as minhas tarefas. Mas esta semana que passou estive três dias inteiros ocupada em afazeres da escola e da formação... terça das 8 às 18 (aulas e reunião de equipa educativa), quarta das 8 às 21 (aulas e formação em Setúbal), quinta das 8 às 18 (aulas e reunião da EMAEI... costuma ser 19, mas foi mais rápid, uff)... ainda me falta a ata do departamento, ler o PE para a reunião de coordenadores e diretora esta semana, concluir o plano de ação, avaliar os PITs (última unidade de CN do PIT1 e MAT.. tudo do PIT1), acrescentar o que falta no PCT das turmas, ajudar a elaborar o regimento do CAA.... começar a preparar o PIT3 de matemática e ciências, ver os trabalhos dos alunos...

Deixei de ter intervalos. Saio de uma sala para outra, sempre a correr. A sensação sempre presente (que tento sacudir) de que a culpa é toda minha. Que não estou preparada para estes novos tempos, para estas novas crianças desamparadas, ou excessivamente protegidas e mimadas, que amuam, choram por tudo e por nada nas aulas, são já tão pouco educadas na forma de se nos dirigirem (aos 9/10 anos), encolhem os ombros quando falamos, bufam de enfado, fazem comentários quando lhe apetece...
A culpa que sinto, o sofrimento ético que me atinge, é saber que uns continuarão a aprender muito e bem (mesmo quando pouco tempo lhes dedico por andar quase todo o tempo de volta de outros que apresentam outros tipos de desafios mais complexos - são cada vez mais) e os outros... Alguns conseguirão fazer bom proveito do tempo extra que tento dedicar-lhes (e ainda assim pouco), outros caminharão amparados por medidas que me parece existirem por se saber bem que, nestas condições, é impossível fazer mais por eles.
Não me preocupa a questão do reprova ou não reprova, aflige-me que estas crianças, quando crescerem, estarão sempre em desvantagem. Não saberão o suficiente, não terão hábitos de disciplina e autocontrolo, não desenvolverão a autonomia e iniciativa, esperarão que todo o mundo se aconchege e adapte a eles, ao invés de fazerem um esforço para se adaptar a uma sociedade que pouco se ralará com a diferença. Não serão contratados porque não possuem as competências necessárias, serão despedidos porque não produzem o necessário. Adiaremos para um dia a perpetuação das desigualdades e lavaremos as mãos contentes porque a escola diferenciou sem diferenciar, ajudou sem ajudar, largando-os com a promessa de que o mundo seria como a escola.  De 50 em 50 minutos precisam de wc, de beber, de comer e, ainda assim, de garrafas de água nas mesas. Perpetuamos a sua infância, falamos com eles como se fala com uma criança do pré escolar. Longe os tempos em que dois blocos de 90 minutos me permitiam gerir programas e desenvolver tarefas complexas, desafiando-os e avançando sem mil interrupções. Com cinco tempos de 50 minutos e crianças com estas características, faço bem menos agora. Sim, tenho de me ajustar, os tempos são outros, mas, por favor, ajustem então também os programas, o número de alunos por professor e, sobretudo, não confundam diferenciação com facilitismo (sim, eu sei que dizem que não e que a culpa é toda nossa).

Quero dar a TODOS as armas e ferramentas para sobreviverem na sociedade inflexível que terão de habitar... e isso significa trabalho de excelência com todos e cada um, com tempo de qualidade (não em quantidade) para os levar a TODOS com seriedade ao seu máximo potencial. Foi este o meu compromisso há cerca de 35 anos, mas sinto que, por mais que me esforce e tente, em cada ano recuo nas conquistas e me afasto cada vez mais do topo do Everest, essa edutopia doce que sempre foi o meu farol em todas as horas...


sábado, janeiro 19, 2019

Da autonomia e de alguns equívocos: o seu a seu dono.

Mais um ano mergulhada no fabrico de papéis por causa das anuais mudanças das leis e orientações e cansada de ter de lutar todos os anos para corrigir erros, ou explicar a diferença entre vários conceitos. Não tenho tido tempo para falar sobre o assunto aqui... mas, entre uma grelha e outra, hoje será.

Repetidamente tenho dito que a estratégia educativa do Ontário - Canadá (na frente de muitas coisas interessantes no mundo da educação, mais do que apenas resultados) tem sido a minha inspiração desde há muitos anos. O que faço de melhor bebi nos documentos que fui encontrando na excecional página daquele ministério da educação.
(Só um pequeníssimo exemplo: o respeito pelo trabalho de quem necessita usar os documentos, incluindo mais do que apenas pdfs...)



- Critérios de avaliação: Todos os anos há uma dança repetida de elaboração dos mais variados critérios de avaliação, ao sabor e gosto de cada agrupamento, por conta de um artigo da lei (que vai variando no conteúdo ao longo dos anos, e dos ciclos políticos, mas diz basicamente sempre a mesma coisa e obriga a escolas a definir critérios de avaliação sustentados nas aprendizazens comuns nacionais). Este ano tem sido particularmente estranho já que, uma vez mais, surge uma portaria em agosto que determina, no seu artigo 18,  mais coisas ainda:

1 - Até ao início do ano letivo, o conselho pedagógico da escola, enquanto órgão regulador do processo de avaliação das aprendizagens, define, de acordo com as prioridades e opções curriculares, e sob proposta dos departamentos curriculares, os critérios de avaliação, tendo em conta, designadamente:
a) O Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória;
b) As Aprendizagens Essenciais;
c) Os demais documentos curriculares, de acordo com as opções tomadas ao nível da consolidação, aprofundamento e enriquecimento das Aprendizagens Essenciais.
2 - Nos critérios de avaliação deve ser enunciado um perfil de aprendizagens específicas para cada ano ou ciclo de escolaridade, integrando descritores de desempenho, em consonância com as Aprendizagens Essenciais e as áreas de competências inscritas no Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória.
3 - Os critérios de avaliação devem traduzir a importância relativa que cada um dos domínios e temas assume nas Aprendizagens Essenciais, designadamente no que respeita à valorização da competência da oralidade e à dimensão prática e ou experimental das aprendizagens a desenvolver.
4 - Os critérios de avaliação constituem referenciais comuns na escola.

Algumas reflexões:
a) uma portaria saída em agosto, obriga que até 1 de setembro esteja tudo feito...
b) achava eu que as aprendizagens essenciais eram o perfil de aprendizagens específicas para cada ano... mas parece que não, parece que temos de as reescrever, digo, enunciar...
c) associar descritores a cada uma das aprendizagens específicas produziria um livro com muitas dezenas de páginas... combiná-los para obter níveis de desempenho, cobrindo todas as possibilidades... matematicamente seria uma tarefa impossível, ou então não percebo e confesso aqui abertamente a minha ignorância sobre o que se pretende...
d) pedimos esclarecimentos e a resposta foi... cada escola é que tem de fazer... (autonomia)
e) resistimos mais um pouco e, pronto, lá começámos a receber documentos feitos por outras escolas para nos "inspirarmos" e fazermos tudo num instantinho para estarmos conformes com a lei...

Falemos então de justiça, equidade, autonomia, responsabilização, flexibilidade e do Ontário.
Parece-me claro que, se existe um currículo nacional (AE e Perfil), compete à tutela estabelecer os critérios comuns de avaliação para cada disciplina desse currículo (deixando à escola a tarefa de o fazer na sua oferta específica de outras oportunidades). Os níveis de desempenho/proficiência, as ponderações, as orientações deviam ser comuns a todos e não apenas a cada escola. Autonomia não é cada escola definir os seus critérios em cada disciplina, as suas ponderações disto e daquilo em disciplinas do currículo nacional... (quando os alunos transitam entre escolas, evidencia-se a desigualdade de ter mais ou menos sorte com o que lhe calha... em sorte). A autonomia (e a flexibilidade) deviam centrar-se nos caminhos escolhidos, na organização do trabalho, na forma como se apoiam os alunos com mais dificuldades, na gestão curricular, como se luta contra a indisciplina, como se educam aqueles pais que são mais obstáculo do que parceiros, na decisão e construção de materiais didáticos e outros recursos ajustados às crianças que serve, nos projetos que desenvolve, nas disciplinas de oferta que estão ajustadas às necessidades da comunidade próxima e ajudam todos a chegar lá, ao sítio comum onde todos devem chegar, com maior ou menor nível de proficiência e com uma avaliação balizada por critérios nacionais, independentemente da origem de cada agrupamento e alunos. Se assim não for, não há transparência nem honestidade no processo. O que se pretende é que cada criança tenha a possibilidade de ter as mesmas oportunidades no mundo real, através de um caminho diferenciado, flexível, que a motiva, que mais se ajusta a si, promove todo o seu potencial, caminho esse desenhado autonomamente e responsavelmente pela sua escola (com as parcerias necessárias, entre as quais se inclui a família).

Espreitem aqui no Ontário para ver como se faz esse trabalho de definição de patamares/níveis de proficiência/critérios comuns (da responsabilidade do seu ministério da educação) com coerência e consistência ao longo dos anos. Têm um excelente documento de base orientador (deixo pequenos excertos que clarificam razões e intenções) e, depois, no conjunto das aprendizagens esperadas para cada ano, em cada disciplina, são incluídos os critérios (PERFORMANCE STANDARDS – ACHIEVEMENT CHARTS).

Criterion-referenced Assessment and Evaluation 
Ontario, like a number of other jurisdictions, has moved from norm-referenced to criterion-referenced assessment and evaluation. This means that teachers assess and evaluate student work with reference to established criteria for four levels of achievement that are standard across the province, rather than by comparison with work done by other students, or through the ranking of student performance, or with reference to performance standards developed by individual teachers for their own classrooms. (There is no expectation that a certain number or percentage of students must be allocated to any one level of achievement.) In the past, assessment and evaluation performance standards varied from teacher to teacher and from school to school, and this led to results that were not always fair for all students. Criterion-referenced assessment and evaluation ensure that the assessment and evaluation of student learning in schools across the province are based on the application of the same set of well-defined performance standards. The goal of using a criterion-based approach is to make the assessment and evaluation of student achievement as fair, reliable, and transparent as possible.








Deixo um exemplo dos "standards" para a matemática, comuns do 1.º ao 8.º anos, que constam no documento - Ontario - com as aprendizagens essenciais para a matemática (podem consultar os das vossas disciplinas). Como já defendi na escola, o referencial devia ser comum do 1.º ao 9.º ano... mas como a portaria diz que é por ano ou ciclo...farei copy paste e apresentarei para aprovação dois documentos iguais para o 2.º e 3.º ciclos... o 1.º é outra história e em breve estará incluído, como aqui.
Os nossos critérios sempre foram inspirados neste exemplo, desde há uns anos (com simplificações, pois não posso ir com muita sede ao pote... e é preciso fazer com calma o caminho desde a ponderação associada às ferramentas de avaliação... 70% para os testes etc. até à ponderação associada ao domínio de competências pelos alunos... em boa verdade, nunca apliquei isso, mesmo quando na escola isso eram os critérios... tenho esta mania da infidelidade normativa, quando fundamentadamente sei o que não é correto.).
E este ano já tive de lutar pelo direito a não colocar pesos (!!!!!) nos Temas (Geometria, Números, OTD, Álgebra... !!!!!), mas sim, já que tem de ser, no conhecimento/compreensão de conceitos de qualquer tema matemático vs competências transversais de resolução de problemas, raciocínio e comunicação..... competências estas que, nas AE nacionais, surgem na coluna dos temas/conteúdos (!!!!)  - ao contrário do que acontecia no programa de 2007, onde lhes era dado o devido e correto destaque como competências transversais que atravessam todos os temas organizadores e conteúdos matemáticos).


Outro exemplo para critérios no caso das linguagens  maternas (native languages). Incluído, claro, no currículo/aprendizagens esperadas.


Como não podia deixar de ser... já chegou um questionário de monitorização (controlo), para saber os pesos que se dão em cada escola aos domínios e temas(?) em cada disciplina... Gasta-se tempo no ME a produzir mais uma grelha para a plataforma, que a direção preenche para se monitorizar (vigiar) o cumprimento de uma lei, lei essa que manda as escolas fazer o que devia ser responsabilidade do ME.
E é isto.

Eu quero Autonomia em tudo o que é da minha responsabilidade. Sim. E, acima de tudo, quero serenidade, quero tempo para o que é essencial, para o que verdadeiramente muda as práticas e a qualidade do sucesso: as aulas, os meus alunos, a gestão curricular, o trabalho colaborativo para partilha de práticas, não para construção de mais uma grelha.
Se fizerem o que vos compete com qualidade e responsabilidade (independentemente da cor e com consensos alargados), se amadurecerem ideias (quiçá alicerçadas em bons, corretos e sérios exemplos e práticas, bem como com o contributo de professores reais que conhecem bem o terreno das escolas), se gastarem o vosso tempo a ponderar tudo antes de fazer sair ideia atrás de ideia, prohrama atrás de programa, decreto atrás de decreto, se assumirem a parte que vos cabe na tarefa,  a nossa também poderá ser feita com maior qualidade e melhores resultados.
O seu a seu dono.


quarta-feira, novembro 14, 2018

Reflexões, preocupações (grandes) e recursos (pequenos) para resolver algumas coisas...

De ano para ano cada vez é mais difícil rentabilizar uma aula (demoro 15 minutos todas as manhãs para iniciar o trabalho, entre atrasos, conversas e agitações iniciais, lentidão para preparar o espaço de trabalho... e, pelo menos, 10 minutos nas restantes aulas do dia). Eu estou na aula ao toque. 

É, também, cada vez mais comum ter um número elevado de alunos sem níveis de autocontrolo e responsabilidade adequados à idade (fundamental no trabalho autónomo em grupo, por exemplo), que se comportam no 2.º ciclo como se nunca tivessem estado numa aula, ou desconhecessem as regras para a participação num espaço que é de todos. Alunos incapazes de escutar, de se focar por mais do que poucos minutos numa tarefa, numa explicação (mesmo quando a solicitam e a dirigimos ao seu ouvido), que desistem rapidamente dos desafios, que necessitam de infindáveis chamadas de atenção para se concentrarem (não precisam sequer de estar a conversar... basta olhar os seus olhos divagando), que, mesmo face a problemas de extrema simplicidade, são incapazes de folhear o livro, ou caderno, em busca de uma resposta, comparar imagens idênticas, ou informação semelhante. Apáticos ou hiperativos, sobrecarregados de explicações e centros que os acolhem nos tempos nunca livres, não têm autonomia, não mostram iniciativa, sempre dependentes do adulto (pais, explicadores, professor...), apenas vibrando em interações despropositadas com pares (empurrões, gritos, vocalizações sem sentido nos corredores...), ou sentados pelo chão e bancos (sem comer, sem brincar, sem correr, esquecendo-se da casa de banho, para logo de seguida entrarem e pedirem para sair...) agarrados aos telemóveis, jogando e comparando jogos uns com os outros nos intervalos. Queixam-se os funcionários do desrespeito crescente, logo no 5.º ano, queixam-se os professores desalentados (aqueles que, confiando em si e na sua perceção, com uma experiência grande cheia de investimento pessoal, não ocultam a frustração e procuram soluções através da partilha) do pouco tempo que sobra em cada aula para trabalho efetivo, por entre tantas conversas necessárias para corrigir formas de estar e trabalhar. Eu sou um deles. Os alunos com sucesso são precisamente os que desenvolveram a sua autonomia, não dependem dos adultos para tudo e têm o nível de maturidade adequado para saberem distinguir os espaços que habitam (ainda que, também nestes, se note uma adesão ao barulho, à conversa, a mais interrupções para brincar e rir durante o trabalho... prejudicando igualmente o ambiente da aula). Claro que não é preciso estar de cara fechada... há anos que trabalho com alunos em grupo e não é disso que se trata. Noto agora a diferença logo na passagem do 5.º ano para o 6.º, coisa que não acontecia antes. Normalmente era bem interessante vê-los crescer e aperfeiçoar a sua autonomia de um ano para o outro... Neste ano com as minhas turmas foi o oposto, parece que regrediram na postura e trabalho, até nos conhecimentos e hábitos de estudo, ou cumprimento de tarefas, depois de um quinto ano bastante bom. E... as minhas turmas estão entre as melhores. As queixas dos professores das restantes turmas são semelhantes e numa turma comparável (que teve melhor desempenho no ano passado que as minhas) a diretora de turma (que é a mesma) queixa-se de que este ano ralha todos os dias e em todas as aulas. 

Os programas continuam extensos e a carga horária vai diminuindo. Tentamos estratégias diversificadas e centradas neles, mas eles têm a cabeça cheia de coisas e loisas... e com 28 numa sala, cada um com as coisas e loisas a passearem na cabeça em tempos diferentes, é cada vez mais difícil ajudá-los... sobretudo porque não ouvem o suficiente para fazer perguntas ou pedirem ajuda. Mesmo procurando individualizar o mais possível o trabalho, usando grupos ou pares, circulando pela sala ajudando, repetindo, ajustando as explicações à necessidade e ritmos, não tenho vergonha de confessar que, mesmo sabendo-me melhor professora agora, me sinto a pior professora do mundo, esgotada no final de cada aula (estive vários dias afónica e ainda não recuperei completamente - constipação e esforço vocal sempre a dar aulas), com a sensação de que faço pouco e com o stress associado de que não vou ter tempo para fazer tudo o que é preciso, com este ritmo tão lento de progressão e de conclusão de tarefas da maioria dos alunos.

Fica a confissão. Não estou a fazer juízos de valor, estou a falar do que vejo, do que sei e apenas neste universo, sem generalizar. Os miúdos são o que são, o que os deixam ser, e nem todos são assim. Os que não se incluem neste retrato têm outro tipo de regras e limites em casa e crescem de forma mais equilibrada aproveitando o melhor de tudo, equilibrando todas as dimensões (tecnológica também, é claro) e possuindo uma autonomia e resiliência que os levará mais longe, sem deixarem de ser crianças, porque conseguem decidir, fazer com autonomia, avançar sem precisar de constantes empurrões dos adultos e, sem isso, o sucesso escolar torna-se progressivamente mais difícil. 
Na escola podemos ajudar, mas não podemos substituir-nos às famílias. Cada um no seu papel.

Por tudo isto e não apenas, regressei à criação de pequenos vídeos de ajuda, muito artesanais e sem pretensões, para tentar prolongar a minha presença junto deles, estimulando um pouco a sua autonomia (pelo menos na procura da informação e na escuta mais calma e focada em casa), ou simplesmente permitindo o revisitar de assuntos e aulas "ao vivo". 
Só servirá se quiserem aproveitar o recurso... mas acredito que poderá ser útil a muitos, sem resolver a maioria dos problemas que referi e que precisam de outro tipo de intervenção.

Até agora usava o "Show me" no ipad... mas é pouco "free" e esgotei o teste.
Procurei alternativas e encontrei duas:
- Educreations (gratuito, mas com limitação de arquivos a 50Mb e apenas um rascunho de cada vez), com partilha em site próprio.
- Stage (comprei o PRO) para não ficar limitada, que permite criar vídeos passíveis de arquivo na pasta de imagens do ipad e depois podem ser enviados para o nosso computador e, claro, carregados no nosso canal do YouTube ou outro.

Reativei a salinha de estudo  muito artesanal e virtual do departamento (muito abandonadita, porque, enfim... devem imaginar as razões, já que todos sofremos com as semanas de mais de 40 horas na escola atual) e regressei à partilha de recursos. Agora que a voz está finalmente a recuperar, fiz duas experiências (um bocadinho toscas - one take only) com ambas as aplicações.

E era isto...



 

domingo, setembro 30, 2018

O carrossel da educação, a infidelidade normativa e outras coisas mais...

https://ciberduvidas.iscte-iul.pt/consultorio/perguntas/carrosselcarrocel/15690
Desengane(m)-se a(s) tutela(s) se pensa(m) que os normativos legais normalizam seja o que for.
No currículo nacional de 2001 o que falhou foi a infidelidade normativa (quem pura e simplesmente continuou a fazer o que sempre fazia, fingindo que fazia diferente só porque mudava uma grelha ou outra), persistindo numa abordagem fria e desapaixonada do currículo e da educação, sem nunca ter em conta os alunos e reduzindo-os à condição de coisas e médias de testes. Paradoxalmente, foi também a infidelidade normativa que permitiu o sucesso de adaptação em muitas escolas e gerou inovação e sucessos inequívocos. O problema é sempre o mesmo: quem olha para si próprio e sofre do bom (senso) desejo de ser melhor fazendo diferente, não precisa de normativos para mudar e evoluir no bom sentido em cada ano que passa. Aproveita as oportunidades e reinventa o possível, protegendo os alunos do mau e filtrando o bom... porto seguro onde algumas normas são desrespeitadas para garantir que os alunos não sofram constantemente com os tsunamis políticos e as deambulações e devaneios de quem não faz ideia do que acontece na escola real, ou os constrangimentos e contradições que impedem a ação legislada. O enorme problema das tutelas passa essencialmente pela falta de fé nas gentes que tutela e, portanto, pela necessidade de controlo (quantas vezes disfarçado com a palavra autonomia) num carrossel que se sucede de administração em administração, com ciclos e ciclos e mais ciclos a recuperar ideias antigas e a maquilhá-las (complicá-las) como se fossem novidades.
Portanto, é possível mudar tudo, todos os papéis, todas as matrizes curriculares, grelhas e organização escolar, sem tocar numa linha que seja da prática educativa. O problema é que os melhores profissionais deste país (e, acreditem, há muitos) não conseguem fingir que fazem sem fazer, não conseguem habituar-se a não ter tempo para estudar, refletir, inovar, porque o foco do seu trabalho tem vindo a ser deslocado para o vazio da conformidade dos papéis, e estão mais cansados do que os demais, por conta do esforço enorme para proteger os alunos (o que os leva a trabalhar a desoras com pouco descanso). Já os restantes (que, acredito, sejam uma minoria), tão depressa defendem uma coisa como o seu contrário, para estarem de bem com a tutela e em conformidade legal, mas, na prática, continuam a fazer (mal) o que lhes apetece e o (pouco) que sabem fazer, porque nunca investiram pessoalmente numa mudança real, que vem sempre de dentro para fora e não o contrário.
Já me ri amarela e solitariamente ontem, ao concluir uma das fichas de autoavaliação que, depois de passar por inúmeras formas, para estar de acordo com os devaneios legislativos dos últimos anos, está praticamente igual à que construí quando ainda ninguém usava ou fazia nada disso, apenas porque eu sabia a importância da autorregulação, da metacognição e da transparência dos critérios de avaliação. É muito raro um aluno meu propor para si um nível diferente do meu e, normalmente, é sempre menos (por vergonha de sugerir o 5). Quando propõe mais e os seus argumentos são válidos, face aos critérios e a uma autoavaliação bem feita, também subo. Estou a falar de crianças do segundo ciclo...
Dizem alguns que os professores são velhos e rígidos e que, se a tutela e as direções não impuserem coisas, nada muda. É falso... Quem muda, como quem ama, como quem lê, fá-lo porque quer, não porque alguém manda. Mudar não se conjuga no imperativo. E a frágil paz do assentimento e da falta de reclamação (os professores são, apesar de tudo, uma classe dividida e muito silenciosa, na maioria das vezes), revela mais o medo de dizer não a quem manda do que a concordância com tudo o que somos obrigados a fazer (as palavras liberdade, sentido crítico ou democracia e cidadania, espalhadas pelo perfil dos aluno, são apenas isso... palavras, porque a falta de confiança em nós, e o hábito do medo, não se apagam de um dia para o outro em gerações de adultos - educadores - habituadas a obedecer cegamente e a ser maltratadas como os párias que nada fazem, com vergonha de dizer que são professores).

Resta-me, então, tentar inspirar os professores que coordeno, ajudá-los a encontrar melhores caminhos e melhores práticas (letivas e avaliativas), que conduzam a um sucesso educativo de melhor qualidade, usando a minha experiência bem mais do que os normativos, mesmo com os dez mil mails que lhes enviei na sexta com toda a espécie de informações, pedidos, leituras e afins, sufocando-os até à exaustão, mas sossegando-os na medida do possível, para que possamos, como sempre, dar o nosso melhor com a necessária calma.

E sobra-me, pois, a tal infidelidade normativa... no meu caso para o melhor. Sou inteligente, sou uma excelente professora (hoje não me apetece a falsa modéstia), com provas dadas nestes quase 40 anos de serviço, tenho cabeça para pensar e sempre fiz diferente quando achava que o que me pediam prejudicava os alunos. Não devo estar assim tão errada porque, mais uma vez, depois da fase crato (julga ele que eu usei aquelas duzentas mil metas, ou obriguei  os meus alunos a decorar conteúdos sem jeito, mas protegi-os sempre, fui exigente e orgulho-me de criar alunos que gostam de matemática e aprendem a pensar)... até regressámos a um programa de matemática praticamente igual ao anterior ao do senhor C, quando fui formadora de professores e fiquei finalmente feliz por ter um programa decente em mãos (2007). Nem tudo é mau agora e sou otimista... Depois do disparate pegado que foram as primeiras aprendizagens essenciais feitas à pressa, num agosto de má memória, que me obrigaram no ano passado a reescrevê-as para o meu departamento, finalmente estas (também apresentadas próximo de agosto... triste e desrespeitosa mania) retomam os bons princípios da educação matemática e são uma base de trabalho boa para tudo o que temos de fazer. Apenas continuam a laborar no erro, repetido das primeiras AE, de considerar capacidades transversais (resolução de problemas, raciocínio e comunicação matemática) como temas organizadores a par de números e cálculo, geometria, álgebra e OTD... Já que não me escutaram no ano passado, olhem, por favor, para o programa de 2007, porque lá esse erro não aparece e, já agora, a propósito de bons recursos que vos podem ajudar agora (novamente) a trilhar os caminhos do atual programa (repescado de 2007), partilho também a página de internet do programa de formação contínua em matemática (ESE/IPS) quando fui formadora e responsável pela construção desse espaço de apoio aos formandos e professores em geral. Se juntarem o programa de 2007 aos recursos da página e tiverem tempo para ler alguma coisa, podem encontrar muito do que precisam neste ano letivo.

Em síntese, meus queridos miúdos e pais, neste início de ano letivo, prometo-vos solenemente não fazer flutuar as minhas exigências, discursos ou práticas, que fui validando ao longo dos anos com a experiência e muito estudo (num tempo com tempo para estudar), porque vos quero bem e solidamente formados para o futuro difícil e incerto que vos espera. Prometo continuar a fazer por vocês o meu melhor. Porque, por mais que me digam que o paradigma mudou, isso não é verdade. O único paradigma, o único dogma, é fazer os alunos aprender cada vez melhor e tornarem-se boas pessoas. Não por causa de leis que mudam todos os anos ao sabor de nenhum vento, boas e más, presas a um infinito carrossel, ou por causa das dez competências gerais de 2001, transformadas agora no perfil dos alunos de 12.º ano (não conheço nenhuma pessoa assim e políticos passageiros ainda menos), ou por causa disto ou daquilo, mas apenas porque... se este país for populado com boas pessoas, cidadãos fortes, e excelência, nenhuma tutela poderá, jamais, no futuro, mandar e desmandar sem reação ou consequências. Eu amo o meu país e quero o melhor para ele.

P.S. E, já agora, que tal uns patamares de proximidade no perfil do aluno, por ciclo, que já pedi diretamente ao SE João Costa numa sessão pública, para ser mais fácil programar o trabalho nos primeiros anos do básico? Ah... é verdade... como também  já ouvi dizer... cada escola é que sabe e faz como quer. Essa autonomia eu dispenso... O currículo, enquanto documento nacional de referência, não pode ser apenas um documento edutópico que na prática depois não nos ajuda a planificar o trabalho e se presta às mais diversas interpretações.

E, uff, respira fundo teresinha, que tens mais uma ata para acabar e ainda é preciso enfiar os critérios numa tabela mais a jeito da portaria 223 de agosto, para levar a CP (quarta), acabar a construção das fichas de autoavaliação, preparar a reunião da equipa multidisciplinar e ler o manual de apoio com montes de páginas a ver se ganhas competências instantâneas no assunto e entendes todos os impressos que vais ter de ajudar a preencher para os alunos com n.e.e. (segunda), começar a pensar no PAA (até 12 de outubro), monitorizar o PA do departamento (2017/2018) com os resultados escolares, preparar as atividades interdisciplinares das turmas e a reunião quinzenal da equipa educativa (segunda), organizar os documentos da supervisão pedagógica e partilhá-los motivando o teu departamento para executar a dita, organizar a drive do departamento, preparar as aulas da próxima semana e... tudo o mais que aparecer de surpresa, para além de "dar" aulas... quase me esquecia. Se não me valesse o meu sentido de humor e uma gestão adequada do stress, para evitar o aumento de cortisol e a engorda abdominal associada, estaria de rastos. Em vez disso, o peso passou para os 47 (bem que lhe dou com um geladito de vez em quando, mas sem grande sucesso) e não sai daqui. Uma vez que estes "stresses" cada vez são de maior duração (e esse é o problema), aprendi a enganar o cortisol apenas com uma atitude positiva, defensiva e protetora da minha sanidade mental... !




terça-feira, dezembro 12, 2017

Matemática, magia e mistério...

Desde ontem dias de muita atividade desportiva na escola e menos alunos nas aulas.
Regressei a uma paixão antiga que costumava partilhar com os alunos e peguei no meu livro velhinho do Martin Gardner (aparentemente uma preciosidade, agora esgotado), num dos meus baralhos de cartas, em alguns apontamentos e no fim de semana treinei uns quantos truques matemágicos.

Truques feitos... espantos, depois repetições, alguns alunos começam a pensar, descobrem o truque, o truque é partilhado com todos, dissecamos as razões dos efeitos, eles experimentam, treinam, partilham também truques aprendidos em casa, o tempo corre e toca sem darmos conta. Acho que algumas famílias neste Natal vão ter meninos a fazer matemagias. Andei hoje por aqui na internet e já levo mais uns na manga... quer dizer... nada na manga! 😏
Há muitos outros sítios onde encontrar boas ideias, para além do livro "Matemática, magia e mistério"

Outras formas de fazer matemática, de treinar o espírito de observação, de fazer pensar, usar a lógica, trabalhar a memória e o cálculo mental, resolver problemas e, depois, partilhar em casa o seu poder matemágico.