Já passaram alguns anos desde que a Alison entrou na minha vida como um relâmpago. Energética, acelerada, determinada... nunca foi minha aluna em sala de aula, mas apareceu no Clube Scratch time perguntando se podia inscrever-se. Tinha 9 anos e acabara de entrar para o 5.º ano.
Nas sessões de formação Scratch para professores, conto sempre a suas história com o Bolt... De como perguntou se era possível "pôr o Bolt a correr"... de como desenhou o cão, pediu à Mãe para digitalizar as imagens e no Clube aprendeu a fazer animações.
No ano que passou fez-nos uma surpresa doce que contei aqui pois, agora já no 8.º ano, resolveu melhorar um pouco a sua primeira versão do Bolt e voltou a publicá-la.
Nunca deixou de programar com o Scratch. Adora desenhar, adora inventar e contar histórias e os seus projetos têm uma marca muito pessoal que os distinguem de outros. Programar é algo pessoal e revelador da individualidade. Cada um de nós é único e a Escola devia reconhecer essa verdade. Urge usar ferramentas que não uniformizem, que não limitem quem somos nem o que sonhamos.
Partiu para Inglaterra onde continuará a estudar, agora no 9º ano, e acabei de descobrir um projeto seu em Inglês, decerto já publicado a partir da sua nova casa.
Já o comentei. Precisa de ser melhorado, claro. Algumas legendas são muito rápidas, existem alguns erros na escrita em língua inglesa, mas, desculpem-me os puristas, olho para ele... sigo a história deliciada e consigo ver para além do pormenor o quanto a Ali vai crescendo na sua criatividade, no seu sentido apurado de perspetiva e realização, na sua persistência e determinação.
Muitos dos seus projetos não são complexos do ponto de vista da programação. Este suporta-se no desenho de cenários sequenciais e a programação não é mais do que um conjunto de ordens para que os cenários se sucedam como imaginou, para que contem a história como deseja contá-la. A ferramenta é o meio para lá chegar, é o suporte para as suas ideias, é a forma de chegar facilmente aos outros. Aprende com a programação, claro, sempre... mas muito para além disso opta por usar as TIC ao serviço da criação, da construção, da reinvenção e vai crescendo como ser humano.
As TIC são terreno fértil para a semente de todo o seu potencial criador. Em vez de as usar apenas no consumo do que outros fazem, a Ali, no verdadeiro espírito Web 2.0, é produtora de conteúdos que oferece aos outros de forma simples. O Scratch, por ser tão flexível, permite tudo e estimula esse importante gesto de construir com as TIC. É integrador, aglutinador de outras ferramentas, é simples e complexo, permite avançar na educação matemática de conceitos-chave complexos (mesmo com crianças de tenra idade), permite desenvolver técnicas de comunicação e o domínio da língua materna, promove o desenvolvimento do espírito crítico e do sentido de responsabilidade (não se partilha qualquer coisa com o mundo), ou apenas ser um meio para que a criança ou o jovem expressem outras habilidades e competências que a Escola nem sempre valoriza (infelizmente) reforçando a sua confiança e auto-estima. É um caminho para o currículo formal para as crianças que dele se afastaram, ou cujas dificuldades constituem obstáculo denso. É um caminho para a excelência, no outro extremo, quando as crianças "filhas de um Deus maior" querem mais e a Escola não oferece outros caminhos para além dos da mediania em que vive.
Como sempre, o elemento humano é a coisa-chave. Educamos e formamos pessoas e não podemos desperdiçar uma só ferramenta que nos ajude a torná-los melhores cidadãos deste século. Pode ser o Scratch ou outra qualquer (ele socorre-se de todas e do trabalho sem TIC para se tornar ainda mais rico no seu alcance)... mas desiluda-se quem acreditar que só por mudar os meios e fazer o mesmo nas aulas os milagres acontecem. As TIC são os que as pessoas querem que sejam. Sem professores, sem alunos e sem formas de utilização bem pensadas e com metas adequadas, não produzem melhor educação.
A maioria dos alunos que experienciou o Scratch não se tornará programador, poderão mesmo nunca mais programar, mas crescem e desenvolvem competências variadas de forma consistente que não vão desaparecer do seu currículo interior enquanto pessoas.
Aprender a língua materna não produz por si só escritores... mas desenvolve em nós muito mais do que competências linguísticas. Aprender ciência ou artes não produz necessariamente cientistas ou artistas, mas se o trabalho da escola for bem feito, fazem a diferença no futuro individual e comum.
E os professores que oferecem aos seus alunos experiências variadas com as TIC, numa perspetiva de inovação das formas de ensinar e aprender, também crescem com eles e são muito mais felizes.
Se mais não fosse... já chegava para valer a pena a experiência neste mundo tão cheio de desilusões e tristezas.
Alguém quer começar?
Deixem-se surpreender...
http://eduscratch.dgidc.min-edu.pt/
Votos de Boas Festas
Há 5 anos
2 comentários:
:)
Acabei de ler um texto da blogosfera em que é defendido que o papel do professor é "instruir", "transmitir....". Ainda bem que vim aqui a seguir, para me passar a má disposição!
(Claro que não nego o papel de instruir, mas não é preciso explicar que o perigo do referido texto é outro, tu percebes)
Beijinhos
Percebo-te tão tão bem... Eu gosto do verbo ensinar e gosto da palavra instruir... mas a Escola é muito mais do que tudo isso... ou, talvez, melhor... essas palavras implicam (deveriam implicar) sempre aprendizagem do outro lado (e não treino condicionado... pois... o perigo), ou não são dignas do nome. Ora os caminhos para levar os alunos a aprender são muitos... e neste mundo em que vivemos não podem dispensar as tecnologias... Enfim... Compreendo-te muito bem...
Beijinhos
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