De ano para ano cada vez é mais difícil rentabilizar uma aula (demoro 15 minutos todas as manhãs para iniciar o trabalho, entre atrasos, conversas e agitações iniciais, lentidão para preparar o espaço de trabalho... e, pelo menos, 10 minutos nas restantes aulas do dia). Eu estou na aula ao toque.
É, também, cada vez mais comum ter um número elevado de alunos sem níveis de autocontrolo e responsabilidade adequados à idade (fundamental no trabalho autónomo em grupo, por exemplo), que se comportam no 2.º ciclo como se nunca tivessem estado numa aula, ou desconhecessem as regras para a participação num espaço que é de todos. Alunos incapazes de escutar, de se focar por mais do que poucos minutos numa tarefa, numa explicação (mesmo quando a solicitam e a dirigimos ao seu ouvido), que desistem rapidamente dos desafios, que necessitam de infindáveis chamadas de atenção para se concentrarem (não precisam sequer de estar a conversar... basta olhar os seus olhos divagando), que, mesmo face a problemas de extrema simplicidade, são incapazes de folhear o livro, ou caderno, em busca de uma resposta, comparar imagens idênticas, ou informação semelhante. Apáticos ou hiperativos, sobrecarregados de explicações e centros que os acolhem nos tempos nunca livres, não têm autonomia, não mostram iniciativa, sempre dependentes do adulto (pais, explicadores, professor...), apenas vibrando em interações despropositadas com pares (empurrões, gritos, vocalizações sem sentido nos corredores...), ou sentados pelo chão e bancos (sem comer, sem brincar, sem correr, esquecendo-se da casa de banho, para logo de seguida entrarem e pedirem para sair...) agarrados aos telemóveis, jogando e comparando jogos uns com os outros nos intervalos. Queixam-se os funcionários do desrespeito crescente, logo no 5.º ano, queixam-se os professores desalentados (aqueles que, confiando em si e na sua perceção, com uma experiência grande cheia de investimento pessoal, não ocultam a frustração e procuram soluções através da partilha) do pouco tempo que sobra em cada aula para trabalho efetivo, por entre tantas conversas necessárias para corrigir formas de estar e trabalhar. Eu sou um deles. Os alunos com sucesso são precisamente os que desenvolveram a sua autonomia, não dependem dos adultos para tudo e têm o nível de maturidade adequado para saberem distinguir os espaços que habitam (ainda que, também nestes, se note uma adesão ao barulho, à conversa, a mais interrupções para brincar e rir durante o trabalho... prejudicando igualmente o ambiente da aula). Claro que não é preciso estar de cara fechada... há anos que trabalho com alunos em grupo e não é disso que se trata. Noto agora a diferença logo na passagem do 5.º ano para o 6.º, coisa que não acontecia antes. Normalmente era bem interessante vê-los crescer e aperfeiçoar a sua autonomia de um ano para o outro... Neste ano com as minhas turmas foi o oposto, parece que regrediram na postura e trabalho, até nos conhecimentos e hábitos de estudo, ou cumprimento de tarefas, depois de um quinto ano bastante bom. E... as minhas turmas estão entre as melhores. As queixas dos professores das restantes turmas são semelhantes e numa turma comparável (que teve melhor desempenho no ano passado que as minhas) a diretora de turma (que é a mesma) queixa-se de que este ano ralha todos os dias e em todas as aulas.
Os programas continuam extensos e a carga horária vai diminuindo. Tentamos estratégias diversificadas e centradas neles, mas eles têm a cabeça cheia de coisas e loisas... e com 28 numa sala, cada um com as coisas e loisas a passearem na cabeça em tempos diferentes, é cada vez mais difícil ajudá-los... sobretudo porque não ouvem o suficiente para fazer perguntas ou pedirem ajuda. Mesmo procurando individualizar o mais possível o trabalho, usando grupos ou pares, circulando pela sala ajudando, repetindo, ajustando as explicações à necessidade e ritmos, não tenho vergonha de confessar que, mesmo sabendo-me melhor professora agora, me sinto a pior professora do mundo, esgotada no final de cada aula (estive vários dias afónica e ainda não recuperei completamente - constipação e esforço vocal sempre a dar aulas), com a sensação de que faço pouco e com o stress associado de que não vou ter tempo para fazer tudo o que é preciso, com este ritmo tão lento de progressão e de conclusão de tarefas da maioria dos alunos.
Fica a confissão. Não estou a fazer juízos de valor, estou a falar do que vejo, do que sei e apenas neste universo, sem generalizar. Os miúdos são o que são, o que os deixam ser, e nem todos são assim. Os que não se incluem neste retrato têm outro tipo de regras e limites em casa e crescem de forma mais equilibrada aproveitando o melhor de tudo, equilibrando todas as dimensões (tecnológica também, é claro) e possuindo uma autonomia e resiliência que os levará mais longe, sem deixarem de ser crianças, porque conseguem decidir, fazer com autonomia, avançar sem precisar de constantes empurrões dos adultos e, sem isso, o sucesso escolar torna-se progressivamente mais difícil.
Na escola podemos ajudar, mas não podemos substituir-nos às famílias. Cada um no seu papel.
Por tudo isto e não apenas, regressei à criação de pequenos vídeos de ajuda, muito artesanais e sem pretensões, para tentar prolongar a minha presença junto deles, estimulando um pouco a sua autonomia (pelo menos na procura da informação e na escuta mais calma e focada em casa), ou simplesmente permitindo o revisitar de assuntos e aulas "ao vivo".
Só servirá se quiserem aproveitar o recurso... mas acredito que poderá ser útil a muitos, sem resolver a maioria dos problemas que referi e que precisam de outro tipo de intervenção.
Até agora usava o "Show me" no ipad... mas é pouco "free" e esgotei o teste.
Procurei alternativas e encontrei duas:
- Educreations (gratuito, mas com limitação de arquivos a 50Mb e apenas um rascunho de cada vez), com partilha em site próprio.
- Stage (comprei o PRO) para não ficar limitada, que permite criar vídeos passíveis de arquivo na pasta de imagens do ipad e depois podem ser enviados para o nosso computador e, claro, carregados no nosso canal do YouTube ou outro.
Reativei a salinha de estudo muito artesanal e virtual do departamento (muito abandonadita, porque, enfim... devem imaginar as razões, já que todos sofremos com as semanas de mais de 40 horas na escola atual) e regressei à partilha de recursos. Agora que a voz está finalmente a recuperar, fiz duas experiências (um bocadinho toscas - one take only) com ambas as aplicações.
E era isto...
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Há 6 anos