domingo, março 30, 2008

Da saudade, do carinho (e das perguntas)...

Ora bem.
É Domingo... dia propício à chamada depressão da vizinhança de segunda-feira.
Ainda mais depois de finalmente ter tido algum tempito para pôr algumas poucas coisas em ordem (poucas... que a lista de afazeres é maior que a lista de sonhos...) embora precisasse de muito mais tempo para continuar a fazê-lo.

Mas gosto das minhas segundas. Que são as primeiras de cada semana. As segundas da sala de informática com o 5º, do Scratch time à tardinha... E tenho saudades dos meus pardais.Pois tenho. E já sei... amanhã... todos a quererem contar as novidades ao mesmo tempo.

E a S. atrás de mim a correr professora professora e mais isto e mais aquilo e eu a rir a caminho da sala... agora não... ainda estou no Hawai... e ela a rir... pois... tenho de esperar mais um bocadinho que se acabem as férias da s'tora e ao mesmo tempo a provovar-me com perguntas e histórias e mais isto e mais aquilo.

São cumplicidades. Doces cumplicidades. Carinhos trocados. Neste caso, com a S. já lá vão quase dois anos. E, para além disso, vi a S. crescer aqui na casa quase ao lado. Vi os seus grandes olhos perguntadores desde sempre, os seus pedidos para visitar as minhas chinchilas, as minhas borboletas... as suas lágrimas no dia em que me bateu à porta com um pardalinho quase morto na mão, que morreu depois nas minhas... e precisei de lhe falar da morte... o dia em que abri a porta, ainda cabelo molhado, saída do banho, sim S.? Oh Teresa... era só para fazer uma pergunta: por que é que só há vida na Terra, achas que é o oxigénio? Oh Sara! Deixa-me ir secar a cabeça primeiro!
E depois a coincidência: era eu a professora dela sem saber. Na aula começou por me chamar Teresa e, depois, sem reparos, passou a dizer Professora! (depois do final deste ano, regressaremos ao Teresa que ficará para sempre...)

Gosto que os alunos continuem a gostar de fazer perguntas. A sentir que vale a pena fazê-las. Gosto que contribuir para lhes aumentar a quantidade e qualidade das perguntas durante o caminho que fazemos juntos. Porque as respostas às nossas perguntas devem trazer sempre mais perguntas com elas. E algumas respostas têm mesmo de ser as nossas. Recordo o David (agora homem feito) que me fazia perguntas deliciosas como: oh professora, se o ovo é uma célula só, como é que sai lá de dentro um pintainho pluricelular?
Não recordo quem foi que disse que se conhecia melhor um aluno pelas perguntas que fazia do que pelas respostas que dava. Sábio enunciado.

E é verdade também para um professor.
Por isso nos temos interrogado tanto, embora só queiram de nós que sejamos máquinas de respostas, máquinas de cumprir recados, marionetas cheias de fiozinhos complicados a obrigar-nos a gestos sem sentido, articulações dobradas em impossíveis sentidos.
Temos que dizer que dói. Que não pode ser. Temos de questionar, de continuar a lutar pelo direito a fazer perguntas que nos coloquem em melhores caminhos do que aqueles que insistem em traçar-nos como se fossemos acéfalos...
Continuarei a fazê-las. Sempre fiz muitas. Desde pequena. Assim penetro no mundo e o desvendo. Mato a fome e a sede. Arranjo mais fome e mais sede. Assim procuro fazê-lo um melhor lugar para mim e para os outros. Assim defendo os meus meninos, a escola onde têm de viver.
Não me queiram calada. Não sei as falas dessa personagem muda.

Professor que se esqueceu de como se fazem perguntas, não merece ser professor.

Ora falava eu de quê?
Sim. De saudade e de carinho.
Amanhã matarei a primeira e espalharei como estrelas o segundo.
(Enquanto me deixarem...)

6 comentários:

Anónimo disse...

Cito de memória Agostinho da Silva: Nas nossas escolas, os alunos aprendem a dar respostas, mas mais importante seria ensiná-los a fazer perguntas!
Um abraço, P

Teresa Martinho Marques disse...

Pois... :)

Raul Martins disse...

Hoje não é docinho para o café... É o aperitivo. Aperitivo não só para o almoço mas também para a nova semana que começa. Até a minha "Pipoca" está feliz porque amanhã vai para a escola e tem saudades dos amigos e da professora.
Um boa semana de trabalho cheio de vivências que nos fazem acreditar que estamos no caminho certo.
E que os teus meninos te bombardeiem com perguntas...

Teresa Martinho Marques disse...

Obrigada! Igualmente para ti... :)

Anónimo disse...

Que bonita a forma como escreves.

Venho enviar-te um pequeno diálogo do livro "Alice no país das maravilhas" que tenho numa agenda antiga, acho que vais gostar.
"- Podes dizer-me por favor, que caminho devo seguir para sair daqui?
-Isso depende muito de para onde queres ir _ respondeu o gato.
- Preocupa-me pouco aonde ir_ disse Alice.
- Nesse caso, pouco importa o caminho que sigas_ replicou o gato"

É por isso que o trabalho de um professor é tão importante.

Teresa Martinho Marques disse...

Tens toda a razão Luís... e foi tão bom teres trazido aqui para a teia uma passagem da nossa "Alice no país das maravilhas" que uso muitas vezes... Obrigada pela partilha... :)