quarta-feira, novembro 04, 2009

Das aves, das varandas, das leituras, das tecnologias, dos carros e do resto...



Chego à ESE cedinho porque gosto da palavra cedo e do tempo a mais contido nela. E porque gosto do cantar doce ao desafio dos piscos-de-peito ruivo espalhados pelos sobreiros. E porque, apesar do tempo gasto, me sabem bem as viagens serenas e sem pressa até à cidade com a música a tocar alto e as paisagens, sempre mágicas, das curvas da estrada encostadinha à Serra-Mãe. Não há nada de muito importante, ou em falta, que se possa fazer das eternas e longas listas da vida (nem culpa associada ao repouso forçado) nesse tempo de pausa em viagem: só disfrutar, cantar, pensar.
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Este Outono apetece mais no exterior. Ainda não tenho chave da sala mágica de encontro... mas quando tiver, continuarei a esperar à varanda. Porque gosto desta varanda. Porque gosto do que o olhar me devolve através dela.
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E leio, leio, leio, enquanto espero. Ofereci-me em Outubro uma prenda com a ajuda de duas amigas. O Sony Reader PRS-505 não estava disponível para venda em Portugal através da Amazon UK... apenas podia seguir para Inglaterra. Uma delas a viver por lá e a irmã, minha colega, aqui nesta terra na minha escola. Um filho que viajou até Portugal e o meu sorriso ao explorar/descobrir como tirar o melhor partido da ferramenta. Ainda o kindle não estava disponível para Portugal, como agora está. Mas mesmo estando... optei deliberadamente pelo Sony (e pelo 505... não optei pelo 700, mais caro, touch screen, última versão... não havia necessidadezzzz), tendo em conta as minhas intenções de uso (porta-imensos-documentos, artigos e livros digitais de estudo, que transfiro do PC, para ler quando me apetece, onde me apetece sem peso a mais às costas). Se quiserem perceber alguns porquês da minha preferência pelo Sony, aconselho a leitura de How to Decide Between the Sony and the Kindle eInk Readers ...

É que estou mais uma vez imersa em leituras... e a aprender tanto tanto tanto sobre a realidade da Matemática no 1º Ciclo (e Educação Matemática em geral). Quero estar à altura de poder ajudar os professores dos meus grupos de formação e os seus alunos...
Eu e os desafios que aceito/me imponho... Nada de novo.


E no turbilhão dos dias deste ano (a teia tem-se queixado) procuro esquecer o papelinho afixado que pede novamente Ois até Janeiro, enquanto se aguarda pelo que se deseja que chegue. Sebastião? Tenho missões mais importantes para já. Muitas. Dos meus meninos aos professores e meninos de outras escolas. Prioridades. O tempo tomado até ao segundo (hoje precisava de vir aqui, mesmo sem poder... escrever é uma necessidade... não consigo evitar). Receio de sucumbir à loucura geral e deixar-me ir dormente na maré, se nada acontecer que afaste este nevoeiro que tomou de assalto a Escola, cegando-a sem pedir licença.

E eu, que gasto mais dinheiro em livros e tecnologias do que em carros... que não gosto particularmente deles e pouca atenção lhes presto, redescobri o meu velho amigo de muitas viagens...

Sim. O meu Honda do século passado. Civic, VTec, 1.5, mais de uma dúzia de anos. Comprado em segunda mão como todos os carros da casa. Traí-o com outro (Peugeot 307) durante alguns anos e o Cara-metade acolheu-o, depois de nos roubarem outra coisa velhinha e especial que recuperámos da morte certa (UMM Cournil, protótipo mais pequenino que o UMM normal, que possuía um motor Peugeot 2300 turbo).

Quis o destino que esta semana precisasse de voltar a usá-lo, ao meu Honda, e já não o consegui deixar. Sabia lá eu que se podia ter afeição por ou saudade de uma coisa destas. Uma coisa destas azul e fria. Quente apenas de motor ligado. Nada de ar condicionado, ou som sofisticado. Nada de coisas electrónicas em excesso. Precisando de duas chaves, porque há muito tempo avariou-se o fecho de uma das portas. Velho, velho, velho mas sempre pronto. Sempre suave e deslizante. Sapato velho que não conseguimos deitar fora?
Ele perdoou-me a traição. Voltou aos meus braços trocando de lugar com o cinza prateado que passa a ir para Lisboa e a servir, na mesma, como carro de viagem mais longa e de passeio familiar. Estou mesmo aqui a falar de carros?

A Sara (vizinha e antiga aluna da Turbêturma, agora no 8º ano) interrompeu-me há minutos a escrita batendo à porta para me mostrar uma crisálida de borboleta Zebra, que acabou de encontrar na Serra onde foi passear com o Avô e o primo. "Foi o Neves que me disse de que borboleta era!" O Neves é o meu Kiko das borboletas... Passeámos um dia (aula de Ciências) pela escola, no 5º ano, a olhá-las, a contá-las... e a magia aconteceu.

Dou comigo a pensar como gosto deste mosaico vulgar e belo que a vida tece à minha volta. Vida como a de muita gente. Porque um professor é gente e precisa absolutamente de ser feliz. Faltam-me coisas, claro. Sonhos por cumprir. Saudades inexplicáveis de algo que devia ser meu: o piano que não tenho, o piano que não encontro, o piano que devo ter perdido, o piano que nem sei tocar. Piano tão silencioso...

Os deuses hão-se condoer-se de mim e oferecer-me mais umas vidas até que eu encontre o tempo certo, cheio de tempo, para fazer essa estrada desejada e em falta... Pelo meio, no regresso a casa, o rádio insistia em manter o sonho vivo. Na RFM tocava Evanescence e apeteceu-me prolongar a viagem por mais uns quilómetros em direcção a um qualquer infinito fim...

(Acho que acabei por o fazer hoje... mas com a escrita.)

7 comentários:

Anónimo disse...

Que bom que foi ler este texto. Não sei porquê, mas li-o e no fim sorri. (: Sorri das aves, das varandas, dos carros, das leituras, das tecnologias (nunca tinha ouvido falar mas adorei a ideia de transportar muitaaaaas leituras num só "livro"! *.*)...

Beijinho grande!

Teresa Martinho Marques disse...

Tu és um doce, Princesa, sabias?
Espero que te mantenhas sempre pertinho..... :)
Beijinhos

Raul Martins disse...

Este post/mosaico cheio de cores também me fez sorrir e olhar para a janela da vida com mais sabor e esperança. Vou roubar para o meu cantinho este pedaço de poesia:
"...como gosto deste mosaico vulgar e belo que a vida tece à minha volta. Vida como a de muita gente. Porque um professor é gente e precisa absolutamente de ser feliz."
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Bom fim de semana e permite-me um beijinho de grande admiração. Este teu post é uma oração da noite ao bom Deus em que acredito.

Raul Martins disse...

E que bom recordares o Kiko!

Teresa Martinho Marques disse...

Obrigada, Raul... por esse teu carinho sem tamanho... e essa tua fé nas coisas simples...

Dê Duarte Osório disse...

Que bom ler-te logo pela manhã. Que bom saber-te de volta ao teu Honda azul.
Saudade das coisas simples.

Beijinhos

Teresa Martinho Marques disse...

Tão bom encontrar-te aqui cedinho...
Saudades.
Beijinhos