quinta-feira, setembro 30, 2010

Rol... (Quando começo nunca sei onde acabo)

Pobre da minha teiazita tão abandonada...
A verdade é que ando na fase do fazer (muita coisa de raiz, de novo, como gosto) e com pouco tempo para  umas notícias ou partilhas (confesso, confesso... as ditas acabam mais depressa no vórtice simples e rápido do facebook do que aqui). E ontem reunião de Clubes na Escola e hoje e amanhã aulas, portanto... vim aqui de fugida, acreditando que amanhã terei algumas coisas bonitas para mostrar.

E feias...

De quantas maneiras diferentes podemos escrever agudo?

âgudo
agúdo
agodo ...

e pentágono?

pentagno
pentágno
pentâguno
pentáguno

E "custa" 1 cm abaixo da palavra escrita num enunciado e com três versões do mesmo aluno separadas por 1,5 cm cada? Na resposta a três perguntas... custa quanto? As respostas seguidas:
"cota"
"cuta"
"custa"

Sem falar que 8 pêras  a 0,12 euros cada... custam de 9 euros a 12 euros e coisas assim...
E mais tantas que nem quero lembrar agora. Pergunto-me quem terá sido a professora deles no ano que passou..... E fico triste quando percebo que fui eu ... :(

Confesso um certo desespero inicial, agora que finalmente apliquei o teste diagnóstico e constato (sempre) o que três meses de férias (e não só) fazem às cabeças dos garotos (até às dos meninos de "4" e "5" do ano anterior). E um sistema de ensino que produz isto... é um sistema de que desconfio. Estão no 6º ano e com o turbilhão que é a sua vida... os conceitos perdem-se pelo caminho, não se pratica, não se escreve... empobrece-se e cada vez é mais tarde para voltar atrás.

Soluções? Ando sempre em busca delas, porque me vejo como parte do problema, sempre. Embora com culpas partilhadas. A escrita, o cálculo, deixaram de ser uma prioridade na cabeça e no coração das pessoas. A desconcentração permanente, a diversidade de distracções de todos os tipos, pouco sono, má alimentação, de tudo um pouco junto... vai agravando de ano para ano o panorama já de si fraquito. Aceita-se o erro com naturalidade... Tudo é natural.. errar é humano e etc e tal.

Só coisas más? Não...
Depois há paradoxos... raciocínios brilhantes, trabalhos interessantes (com o que estamos a aprender agora e já vos contei), o entusiasmo deles quando me abordam na rua a querer explicar que descobriram o pi, que já sabem coisas que ainda não trabalhei (mas que os tenho induzido a buscar, criando suspense) e até um vídeo surpreendente (que depois partilharei) integrando parte de um trabalho de uma aluna.

A mesma aluna que coloca hipóteses  excepcionais sobre a relação entre diâmetro e perímetro de um círculo, é capaz de errar as perguntas mais simples e absurdas de um teste. Mesmo revelando ao vivo e a cores uma motivação para a matemática, para a resolução de problemas, uma maturidade e compreensão de raciocínios complexos... falha as coisas mais estranhas... e consegue apenas metade de respostas correctas num teste acessível.

Tenho vários alunos assim... na Matemática já a provar um brilho e uma sobredotação de raciocínio e depois a dar erros ortográficos ou a falhar um algoritmo simples... ou incapazes de relatar por escrito o que aconteceu.

Geração a que teremos de prestar muita atenção... por um lado cabecinhas boas, despertas, capazes de pensar se as ajudarmos, por outro, com muitas competências básicas por desenvolver. E olhem que não é coisa fácil de resolver. Nem pais empenhados às vezes chegam! É algo que nos transcende a todos,  mas que nos devia preocupar. Algo que é reflexo do nosso tempo e modos de vida (de todos nós). Não estou a apontar dedos. Estou a constatar uma dificuldade e temos de nos unir para chegar a algum lado.

Mas professores carregados de turmas, de papéis, de reuniões, a viver com maus horários presos horas nas escolas sem tempo de trabalho pessoal ou de momentos extra com os seus alunos... não são panorama que augure nada de bom para o futuro. A desmotivação, o cansaço e o anular da paixão/vocação não são bons parceiros em educação.
Estamos a colher o que temos andado (e andamos) a semear. As crianças são diferentes, precisam mais de nós e, portanto, as turmas crescem (28 alunos), os professores têm número excessivo de turmas e cada vez mais horas de volta de tarefas e papéis sem interesse.
Perfeito e inteligente. Pontuação máxima para quem conseguiu transformar a escola num formigueiro sem nexo, numa indústria de maus chouriços.

Mas é o universo que tenho/temos.
Por conta disso, dou comigo cada vez mais exigente, mais impaciente (de modo adequado), mais intolerante com as falhas deles e comunico-lhes isso a cada passo. São suficientemente crescidos para aguentarem, para perceberem que não têm escolha: ou querem sair desta coisa a que chamamos escola bem preparados, ou não. Se sim... trabalhem para isso que eu estarei ao lado deles sempre.

Não existe assim-assim em educação.
(Ou não devia existir.)

Ok...
Depois da depressão... Conto amanhã (ou quando possível) começar a partilhar algumas inovações que introduzi este ano. Sem complacência e chamando as coisas pelos nomes.
Não vou aceitar "coisinhas feitas em cima do joelho" como trabalhos pedidos que considero importantes... Ou seja... vem por aí trabalheira da pesada... Mas... se exijo trabalho tenho de dar o exemplo.
Certo?

Dizia eu, no início, que tinha vindo de fugida???
Pois...

6 comentários:

Isabel Preto disse...

Teresa, tenho uma surpresa no meu blog.
Beijos

Teresa Martinho Marques disse...

Já fui ver! Que lindo!!! Obrigada pelo miminho doce. Adorei. Beijinhos

IC disse...

Querida Teresa, acabei de ler e olhei para as etiquetas. Acho que falta uma concreta, pois este teu post é muito importante (não sei sugerir, mas o que o post revela é a preocupante pergunta: Para onde vai a Educação?)
São muitas as partes do problema - as partes responsáveis pelo problema. Os professores foram empurrados para a pouca exigência pelo ME; foram desmotivados; a sociedade e as famílias não educam para o trabalho; são más muitas das formações dadas aos professores do 1º Ciclo (a minha Inês teve um 1º ano infeliz - logo a 1ª missiva da professora tinha erros!; no 2º ano teve que ser recuperada voltando para a escola onde o irmão tinha tido duas excelentes e exigentes professoras, com formação "à antiga"); não há redução do número de alunos por turma; as ministras da educação não conhecem a actual realidade (não sei se mudariam se conhecessem, o economicismo e as estatísticas são as suas prioridades, mas o desconhecimento da realidade escolar agrava tudo)
Eu não diria que as crianças hoje são diferentes; diria que os adultos são diferentes (pais, governo, "valores" da sociedade em geral), gerando isso crianças diferentes.
Beijinhos. Até sábado!

Teresa Martinho Marques disse...

Tens razão (etiquetas e resto). Aver se arranjo uma mais concreta, realmente.....
Beijinhos grandes e até sábado!

Anónimo disse...

Minha querida, alguns de nós são de facto pessoas com potencial para brilhar, e gostam muito de matemática e de resolver problemas, mas têm ligeiras dificuldades de atenção, ou problemas com um tipo de raciocínio muito específico. A inteligência é uma coisa complexa, multifacetada, e pouco compreendida.

Fiz um teste WAIS-3 o ano passado para ver se tinha défice de atenção (tb conhecido como ADHD), rebentei a escala em alguns parâmetros, e fiquei abaixo da média noutros (por muito rápido que raciocine, a simples actividade de copiar símbolos de um lado para o outro é extremamente penosa para mim e faço-o lentamente, talvez seja uma questão de coordenação visual e motora, talvez).

No geral, o teste deu "inválido", ou seja, saio fora dos parâmetros previsíveis pela ciência. Havia um teste que era ordenar séries crescentemente longas de letras, acho eu, e eu acho que "fiz" isso com uma espécie de "sinestesia", tentei repetir para mim próprio a sequência continuamente para não a esquecer (usando talvez a parte vocal e linguística do cérebro) e de repente tinha flashes extremamente visuais de partes da sequência já ordenada.

De facto, a conclusão a que a minha psicóloga chegou com esse teste inválido foi de que talvez eu pense de uma forma diferente das outras pessoas (acho que com o tempo, as pessoas desenvolvem estratégias para lidar com as suas próprias deficiências).

Para mim é por vezes difícil ouvir o que me dizem, manter-me atento a uma conversa, mas tenho uma memória musical e visual extremamente bem apuradas.

O mundo não se divide entre "normais" e "atrasados", há todo um contínuo multidimensional de pessoas com vários tipos de personalidade e inteligência.

Fui sempre dos melhores alunos da minha turma (MENOS a coisas como matemática, educação visual e educação física). Fiz algumas das cadeiras mais avançadas do meu curso com 14 estudando simplesmente de véspera e não pondo os pés em nenhuma aula.

Passei a Álgebra e a Estatística (é tudo essencialmente algorítmico), tenho 10 anos de experiência como programador, montei a minha própria empresa, ganhei concursos de prosa e poesia, mas o tipo extremamente específico de "criatividade" ou manipulação simbólica necessária para obter aprovação a Análise Matemática é injustamente difícil para mim, apesar de a um nível conceptual e abstracto conseguir compreender perfeitamente as coisas e deduzir mentalmente alguns resultados interessantes antes de os ter sequer aprendido.

Enfim, desculpa o testamento :(

Teresa Martinho Marques disse...

:) Não é preciso pedir desculpa... gostei imenso do que dizes, compreendo as questões da multiplicidade de inteligências que encerramos em nós, o facto de elas se ligarem entre si de formas diferentes de pessoa para pessoa. Mas o que é preocupante é que parece (nota que digo "parece") haver uma "mudança" gradual de algo que é mais global do que a multiplicidade que sempre existiu e nem sempre foi (nem é) muito bem compreendida. E é uma mudança, parece, estreitamente relacionada com o vórtice da mudança do mundo... que nos traz desafios enormes para os quais ainda não encontrámos resposta (quando encontrarmos... já tudo terá mudado de novo e andaremos sempre em busca... provavelmente sempre foi assim). A verdade é que a escola não muda (e quando muda não é no sentido de corresponder à mudança do que acontece em torno dela), mas as famílias mudaram, as prioridades, a gestão dos tempos de vida, também. Escuto muitos professores universitários referir a gradual baixa de rendimento e aumento de dificuldades ou "desconhecimentos" dos alunos que vão chegando... empregadores que querem recrutar jovens e que se têm de contentar com o menos mau, porque as competências básicas de escrita ou raciocínio falham e não há centelha, autonomia ou iniciativa em muitos. Nunca nas universidades se viu tanto pai a ajudar os filhos nas matrículas... Não posso fazer afirmação nenhuma, claro. Enunciar hipóteses é fácil... difícil é perceber de que modo se liga esta percepção (talvez carecendo de fundamentação e aprecisar dela) e o que descreves, com toda a lógica e razão. Realmente a diferença sempre esteve presente e é complementar, não tem de ser défice de nada. Mas se generalizadamente ficarmos todos parecidos com o mesmo tipo de défice... isso já parece mais estranho e merecedor de reflexão e alguma atenção para procurar razões. Sejam as que enunciaste, sejam todas as outras possíveis e mais directamente relacionadas com estímulos externos e contextos de vida. Enfim... Não há uma resposta. Há é uma montanha de perguntas. Talvez por isso sempre tenha procurado diversificar as abordagens para poder servir nas aulas as múltiplas inteligências dos alunos... mas há momentos em que desespero porque começo a ficar sem recursos e nem sempre obtenho os resultados que desejava com esse cuidado e essa atenção à diferença...
Obrigada pela partilha reflexão... E, já agora, desculpa tu o meu testamento. Devemos ter um gene comum.